Publicado em: 21/10/2025 às 11:15hs
A bioeletricidade gerada a partir do bagaço da cana-de-açúcar vem se tornando uma importante alternativa para diversificar a matriz elétrica brasileira e reduzir a dependência das hidrelétricas, que sofrem com os efeitos das variações climáticas. Durante o período seco, quando os reservatórios atingem níveis críticos e a produção hidrelétrica cai, a energia proveniente da cana ajuda a manter o fornecimento de eletricidade estável e seguro.
Além disso, essa fonte renovável pode ser direcionada para a geração noturna, atuando de forma complementar à energia solar, cujo pico ocorre durante o dia e que, em alguns casos, enfrenta restrições de injeção na rede.
De acordo com um estudo publicado na revista Renewable Energy, a bioeletricidade gerada a partir do bagaço de cana emite cerca de 0,227 kg de CO₂ equivalente por kWh, valor quase cinco vezes inferior ao das termelétricas movidas a diesel, que liberam 1,06 kg de CO₂ equivalente por kWh.
O diferencial está no ciclo natural da cana: durante a fotossíntese, a planta absorve CO₂ da atmosfera e o transforma em biomassa. Quando o bagaço é queimado para gerar energia, apenas parte desse carbono é devolvido, sem adicionar novas emissões ao ambiente. Com novas plantações crescendo simultaneamente, o processo se renova, mantendo o balanço de carbono equilibrado.
Segundo o pesquisador Vinicius Bufon, da Embrapa Meio Ambiente (SP), esse ciclo faz da bioeletricidade uma fonte de baixíssimo impacto ambiental e de grande valor estratégico para a segurança energética e a transição para um sistema mais sustentável.
Um estudo internacional liderado pela Embrapa, em parceria com a Universidade das Nações Unidas e a Universidade de Bonn (Alemanha), aponta que, apesar de seu potencial, a bioeletricidade enfrenta riscos estruturais e climáticos.
Entre os principais desafios estão:
Bufon alerta que essas vulnerabilidades podem comprometer o papel da bioeletricidade em períodos críticos. “A produção coincide com o período de estiagem, justamente quando a geração hidrelétrica cai. Para garantir estabilidade, é essencial enfrentar as fragilidades estruturais e institucionais do setor”, afirma.
A pesquisa propõe soluções para fortalecer o setor sucroenergético, como:
Bufon destaca que muitas dessas iniciativas já estão em andamento em projetos da Embrapa, com foco em promover uma agricultura climaticamente inteligente, que aumente a produtividade e reduza as emissões de gases de efeito estufa.
A bioeletricidade da cana também se destaca pela sua complementaridade com outras fontes renováveis. Enquanto a energia solar é limitada ao período diurno e a hidrelétrica depende do volume de água dos reservatórios, a energia do bagaço pode ser produzida inclusive à noite e atinge seu pico justamente na época da colheita, que coincide com a estação seca.
“Quando as hidrelétricas reduzem a geração, as termelétricas a biomassa de cana assumem papel decisivo para garantir a estabilidade do sistema elétrico”, explica Bufon.
Os resultados do estudo, publicados na revista científica Environmental Advances, reforçam que países com forte dependência da hidreletricidade, como o Brasil, devem investir em fontes complementares para reduzir vulnerabilidades climáticas e operacionais.
A bioeletricidade da cana também se insere no conceito de Agricultura Climaticamente Inteligente, que busca aumentar a produtividade, fortalecer a resiliência e reduzir emissões. Ao aproveitar resíduos como o bagaço, o setor contribui para a economia circular e a bioeconomia, diminuindo a dependência de combustíveis fósseis e promovendo o uso integral dos subprodutos agrícolas.
O Brasil, por ser um dos maiores produtores de cana-de-açúcar do mundo, possui vantagens competitivas para consolidar a bioeletricidade como uma das bases da sua matriz elétrica. No entanto, o avanço do setor depende de investimentos contínuos em infraestrutura, inovação e políticas públicas integradas de longo prazo.
“Fortalecer a resiliência da bioeletricidade é essencial para garantir a segurança energética e contribuir com os compromissos climáticos internacionais do país”, conclui Bufon.
Fonte: Portal do Agronegócio
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