Pesquisas

Iapar foi o primeiro a dominar a tecnologia de transformação de cafeeiros no Brasil e também identificou e caracterizou inúmeros genes com potencial biotecnológico para múltiplas aplicações

Sediado na cidade de Londrina, o Instituto Agronômico do Paraná - Iapar é umas das instituições fundadoras do Consórcio Pesquisa Café, coordenado pela Embrapa Café


Publicado em: 15/04/2014 às 00:00hs

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Luiz Filipe Protásio Pereira: Pesquisador
Por: Flávia Bessa - Embrapa Café

O Programa Café do Instituto tem realizado pesquisas para o desenvolvimento de modelos tecnológicos de produção adequados às diferentes regiões cafeeiras. Para isso, as ações estão direcionadas ao aumento da produtividade da cafeicultura, à melhoria da qualidade do produto e da bebida, promoção da diversificação das atividades agrícolas nas propriedades, redução de custos de produção, insumos e energia, aumento da eficiência da mão-de-obra e infraestrutura disponível e preservação do meio ambiente. A instituição tem experiência de 41 anos em atividades de pesquisa e transferência de tecnologia cafeeira.

A partir de 1997, com a criação do Consórcio Pesquisa Café, que permitiu a integração e a troca de experiências entre instituições de pesquisa, ensino e extensão, os estudos do Iapar se intensificaram e, juntamente com as demais entidades consorciadas, vem contribuindo para a vanguarda da pesquisa cafeeira no Brasil. O diretor técnico-científico do Iapar, Armando Androcioli Filho, salienta a importância do Consórcio nos últimos dezessete anos e também para outros avanços que a instituição obteve ao longo das últimas quatro décadas. “O Consórcio permitiu avançar nas pesquisas que vinham sendo realizadas antes com novos projetos e ampliação dos já existentes, como o café adensado e o emprego de modernas técnicas de biotecnologias, entre outras, que contribuíram significativamente para que conseguíssemos, por exemplo, aumentar a produtividade média no estado de sete para 24 sacas beneficiadas por hectare”, elenca o diretor. Ainda de acordo com ele, outro fator fundamental foi a melhoria da qualidade do café paranaense. Com relação à transferência de tecnologia, "com o Consórcio, pudemos implementar a metodologia do Treino e Visita, que atualmente é referência no País. Os desafios são constantes e temos muito a avançar, mas juntos potencializamos nossas forças, finaliza.

O Programa Café do Iapar tem, hoje, quarenta projetos em andamento - que vão desde a obtenção de cultivares adaptadas às condições edafoclimáticas do Paraná até estudos avançados de manipulação de genes, visando melhorar determinadas características da planta como, por exemplo, a maturação dos frutos.

Para falar do trabalho desenvolvido pelo Iapar, especialmente da parceria com as instituições consorciadas, conversamos com o pesquisador Luiz Filipe Protásio Pereira. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Londrina - UEL (1986), mestre em Crop Biotechnology (1993) e doutor em Plant Genetics (1998), ambos pela University of Guelph, Canadá. Luiz Filipe é pesquisador da Embrapa Café lotado no Laboratório de Biotecnologia do Iapar desde 1988. É professor dos cursos de pós-graduação da UEL de Biotecnologia no Departamento de Bioquímica e de Genética e Biologia Molecular no Departamento de Biologia. Tem experiência na área de Biologia Molecular e Genética de Plantas, atuando, principalmente, em temas relacionados à qualidade de Coffea arabica: transcriptoma; genômica; transformação de plantas; identificação de polimorfismos; mapeamento genético e físico de cafeeiros.

Embrapa Café: Como avalia as mudanças na cafeicultura do Paraná desde a criação do Consórcio Pesquisa Café?

Luiz Filipe: Desde o início do Consórcio Pesquisa Café, os trabalhos desenvolvidos no Iapar foram realizados de forma integrada, principalmente com as consorciadas fundadoras e a UEL. Essa integração tem importância não só no desenvolvimento científico da pesquisa cafeeira dos institutos de pesquisa e universidades, mas também na formação de recursos humanos da graduação e pós-graduação que trabalham em pesquisa cafeeira. Além disso, o apoio do Consórcio permitiu mais integração com o Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural - Emater-PR, visando à divulgação e implementação de novas tecnologias para os cafeicultores. Dois aspectos do Consórcio são de grande importância para a manutenção da estrutura da pesquisa em cafeeiros. O primeiro é a possiblidade de execução de projetos de quatro anos ou mais. O segundo é o programa de bolsas, importantíssimo, que diminui o problema crônico de carência de recursos humanos dos grupos e órgãos de pesquisa, incluindo a Embrapa.

Embrapa Café: Quais são hoje os desafios e oportunidades no campo da pesquisa e como esse arranjo institucional tem contribuído para integração e desenvolvimento das instituições consorciadas?

Luiz Filipe: O trabalho integrado entre diferentes instituições de ensino, pesquisa e extensão congregadas no Consórcio Pesquisa Café passa por uma série de desafios, entre eles: definir prioridades de pesquisa em comum; achar grupos que tenham afinidade de trabalho e que consigam desenvolver parcerias; e estruturar as equipes de trabalho e de laboratórios. Outro grande desafio é a atual dificuldade na utilização dos recursos do Consórcio Pesquisa Café. Os recursos, outrora enviados para fundações de pesquisa, hoje são repassados diretamente para as instituições, o que dificulta e inviabiliza a sua utilização como planejado. Essa dificuldade, associada a uma maior disponibilidade de recursos para pesquisa tanto em nível federal como estadual, vem afastando pesquisadores do Consórcio e dificultando a atração de novos pesquisadores/grupos para trabalhar com café. É necessário e urgente discussão para avaliar como esses recursos poderiam ser alocados e utilizados de forma mais eficiente pelos pesquisadores.

Embrapa Café: Que linhas de pesquisa você desenvolve atualmente em parceria com pesquisadores do Iapar e demais instituições consorciadas desde sua entrada na Embrapa Café? Poderia destacar alguns dos resultados alcançados?

Luiz Filipe: Temos trabalhos envolvendo desde estudos básicos de genômica e de transcriptômica - com a identificação e clonagem de genes e promotores envolvidos com compostos relacionados com a qualidade de cafeeiro - até o desenvolvimento de protocolos de transformação genética. Nosso grupo de pesquisa foi o primeiro a dominar a tecnologia de transformação de cafeeiros no Brasil e também identificou e caracterizou inúmeros genes com potencial biotecnológico envolvidos na produção de açúcares como sacarose e galactinol; de expansinas, que atuam na formação do perisperma, tecido que define o tamanho do grão do café; e de genes da rota metabólica dos diterpenos, compostos relacionados com o aroma e sabor. Em outra linha de pesquisa, em colaboração com a Universidade Federal de Viçosa - UFV e a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – Epamig, estamos mapeando e identificando gene de resistência à ferrugem do cafeeiro. Os marcadores encontrados vêm sendo validados nas populações de melhoramento do Iapar.

Embrapa Café: O Iapar vem trabalhando em parceria com o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento - Cirad, da França, Universidade de Campinas - Unicamp e Embrapa Café para a criação de variedades de boa qualidade de bebida e tolerantes à seca. Quais os principais resultados obtidos e em que estágio está esse trabalho?

Luiz Filipe: A história dessa parceria (coordenada no Centre de Coopération Internationale en Recherche Agronomique pour le Développement - Cirad pelo pesquisador Thierry Leroy), foi iniciada com a vinda do pesquisador Pierre R. Marraccini durante o período de 2001 a 2005, seguido pelos pesquisadores David Pot (2005-2008) e Pierre Charmetant (2008-2012), todos alocados no Laboratório de Biotecnologia Vegetal do Iapar. A cooperação permitiu o treinamento de dois pesquisadores brasileiros, quatro estudantes de doutorado e um de mestrado no Cirad, em Montpellier. O Laboratório de Biotecnologia do Iapar também recebeu, para treinamento, três estudantes de graduação franceses. Durante esses anos, vários projetos foram aprovados e realizados com recursos do Consórcio Pesquisa Café, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Financiadora de Estudos e Projetos - Finep e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes - Agropolis. Entre os trabalhos realizados estão, por exemplo, estudos de identificação de genes da biossíntese de açúcares e diterpenos, importantes componentes da qualidade de cafeeiros. Também colaboramos em trabalhos de identificação de QTLs em C. canephora e estamos finalizando um estudo de transcriptoma de frutos e folhas de C. eugenioides. Parceria entre Iapar, na pessoa da pesquisadora Maria Brígida Scholz, e o Cirad permitiu desenvolver metodologias para fenotipagem de cafeína e diterpenos, utilizando a técnica de espectroscopia de infravermelho próximo (NIRs). Esse recente trabalho é parte de um grande projeto visando à caracterização da diversidade e estrutura de recursos genéticos de Coffea arabica oriundos da Etiópia. Essa coleção foi fenotipada para diversas características relacionadas à qualidade, como composição de açúcares, diterpenos, ácidos clorogênicos, trigonelina, assim como para características agronômicas. Iniciamos a genotipagem da coleção com marcadores microssatéllites e SNPs, visando a estudos de associação genômica ampla (GWAS). Esse trabalho, iniciado com recursos de um projeto internacional Capes-Agropolis, foi aprovado no último edital do Consórcio em parceria com o Instituto Agronômico - IAC e outras unidades da Embrapa.

Embrapa Café: E sobre o Genoma Café, quais os desdobramentos atuais e o que se espera em termos de produtividade, sustentabilidade e qualidade?

Luiz Filipe: O genoma café foi importantíssimo. Permitiu a identificação de mais de 30 mil genes transcritos e, a partir daí, diversos estudos com a caracterização de genes relacionados a respostas a estresses bióticos e abióticos, qualidade de bebida, desenvolvimento do fruto e endosperma. Esses dados vêm permitindo entendimento cada vez melhor da biologia molecular do cafeeiro, associada à fisiologia, fitopatologia, bioquímica e genética. Também vem permitindo a produção de patentes de genes e promotores. Porém, creio que o mais relevante foi servir como uma alavanca para o desenvolvimento dos grupos de pesquisa em genética e biologia molecular em cafeeiros, que hoje realizam pesquisas cada vez mais voltadas a aplicações diretas ao melhoramento, como a busca de marcadores moleculares, seja em estudos pontuais, como por exemplo, no caso da ferrugem citado anteriormente, e de trabalhos de associação ou seleção genômica ampla (GWAS e GWS), por meio das novas técnicas de larga escala hoje disponíveis tanto para identificação de polimorfismos como para genotipagem.

Embrapa Café: Em 2012, a Embrapa patenteou uma técnica de modificação da expressão de genes em café. Qual seria a importância dessa patente?

Luiz Filipe: Essa patente, obtida em parceria com a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, é para um promotor específico de frutos com potencial para diversos trabalhos, como por exemplo, modificação da composição química do grão, ou expressão de genes para resistência à broca do cafeeiro. Patentes de promotores, bem como de utilização de genes, são importantes para a Embrapa do ponto de vista estratégico, para que não haja dependência da utilização de genes e/ou promotores de outras empresas visando à aplicação futura de técnicas de transferência genética.

Destaque de tecnologias do Iapar - Entre as contribuições do Iapar para a cafeicultura pode-se citar o controle biológico de pragas, o manejo de solo por meio da adubação verde e o lançamento de novas variedades. Também vale ressaltar o serviço do Alerta Geada (http://www.iapar.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=414), que informa e orienta o agricultor sobre a ocorrência de geadas para proteger novos cafezais. Há ainda o sistema de café adensado (http://www.iapar.br/arquivos/File/zip_pdf/ct121.pdf), adequado à nova realidade da cafeicultura paranaense e baseado em pequenas propriedades e na necessidade de plantas menores por conta da escassez de mão-de-obra, o Programa Treino e Visita (http://www.sapc.embrapa.br/index.php/ultimas-noticias/metodo-treino-a-visita-de-transferencia-de-tecnologias-fortalece-cafeicultura-do-parana), que inova o processo de transferência de tecnologia desde 1997, e o desenvolvimento de 13 cultivares de café, boa parte delas com apoio e recursos do Consórcio. Dessas cultivares, seis foram lançadas e comercializadas (Iapar 59, IPR 98, IPR 99, IPR 100, IPR 103 e IPR 107) e sete ainda não foram lançadas (IPR 97, IPR 101, IPR 102, IPR 104, IPR 105, IPR 106 e IPR 108).

Fonte: Embrapa Café

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