Seguro Rural

Seguro Rural: “Governo promete e não cumpre. Cadê os R$ 700 milhões?”

A Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) cobra os R$ 700 milhões de subvenção ao seguro rural prometidos pela presidente Dilma Rousseff há exatos três meses


Publicado em: 04/09/2013 às 17:20hs

Seguro Rural: “Governo promete e não cumpre. Cadê os R$ 700 milhões?”

A Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) cobra os R$ 700 milhões de subvenção ao seguro rural prometidos pela presidente Dilma Rousseff há exatos três meses, segundo eles, com “pompa e circunstância” no anúncio Plano Safra 2013/2014. Na ocasião, o ministro da Agricultura Antônio Andrade afirmou que o Governo elevaria em 75% os valores para este ano.
 
“No discurso, ótimo. A promessa do ministro avalizada pela presidente continua sendo uma dívida com os produtores rurais. O que não é novidade. À semelhança com anúncios retumbantes que não se concretizam, como na logística e infraestrutura do país, por exemplo, nenhum centavo foi liberado para o seguro rural. Aliás isso vem ocorrendo desde 2010 em sucessivos calotes provocados de forma curiosa e estranha por alguns gabinetes do Ministério da Agricultura”, diz a Faep em comunicado.
 
E a entidade denuncia ainda que a “soma dos calotes do governo com as seguradoras, referente à  2012 e primeiro semestre deste ano, atinge a R$ 135,8 milhões, afora esta última promessa dos R$ 700 milhões. Não custa lembrar que a primavera está chegando e junto dela o plantio da próxima safra. Como em anos anteriores, com muito poucos produtores cobertos pelo seguro rural. Os recursos prometidos na solenidade do PAP 2013/14 representam cerca de 50% em média do prêmio do seguro contratado pelo produtor”.
 
Esse panorama foi detalhado pelo presidente da Faep, Ágide Meneguette (foto), em correspondência encaminhada a autoridades em Brasília. No documento são ainda lembrados alguns outros pontos: As seguradoras estão pagando aos produtores os prejuízos dos sinistros devido aos problemas climáticos de 2013 (geadas e chuvas excessivas), mesmo com esses atrasos do governo federal. A situação é tão caótica que se as seguradoras contabilizarem estes não pagamentos do governo federal como provisão de pagamentos duvidosos, esta conta é considerada prejuízo, e a SUSEP poderá intervir em algumas seguradoras.
 
Outro problema está ocorrendo na demora de habilitação de novas seguradoras no Programa de Seguro Rural do governo federal, as quais têm solicitado há alguns meses o credenciamento no programa. Esse atraso é prejudicial aos produtores, pois o país tem apenas sete seguradoras atuando no seguro rural.
 
No documento, Meneguette solicita a quitação dos R$ 135,8 milhões devidos às seguradoras e a liberação imediata dos R$ 700 milhões da safra 2013/14, além de aprovação do credenciamento de novas seguradoras no Programa. O ofício foi encaminhado: à Presidente Dilma Rousseff; Ministérios da Agricultura, da Fazenda, Des. Agrário, Casa Civil, Bancadas do Paraná  na Câmara e Senado; Deputados estaduais e prefeitos.
 
COMO FUNCIONA O APOIO OFICIAL AO SEGURO RURAL
 
Proteger-se de riscos, como os causados por adversidades climáticas, dentre outros, é imprescindível para o produtor rural que, ao contratar o seguro rural, pode recuperar boa parte do capital investido em sua lavoura ou empreendimento, evitando as indesejáveis renegociações de dívidas rurais. Além de mitigar riscos, o seguro rural é indutor de tecnologias, incentivando os investimentos em melhorias de qualidade e produtividade.
 
No entanto, a possibilidade de catástrofes na agricultura e a diversidade de riscos envolvidos elevam os custos e tornam inviável a contratação do seguro rural pelo produtor sem apoio do Governo.  Nos países em que o seguro rural obteve êxito há uma forte presença do Estado apoiando os produtores e no Brasil não será diferente. No âmbito federal funciona, desde 2005, o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). A subvenção econômica concedida pelo Ministério da Agricultura pode ser pleiteada por qualquer pessoa física ou jurídica que cultive ou produza espécies contempladas pelo Programa.
 
O MAPA realizou estudos técnicos com o intuito de melhor adequar a aplicação dos recursos do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural – PSR às prioridades da política agrícola, utilizando-se para tanto do direcionamento da subvenção federal por atividades e microrregiões. A intenção do Ministério é alocar 75% dos recursos do programa nesses municípios prioritários.
 
Dessa forma, para as culturas de soja, milho, arroz, feijão, algodão, tomate, caqui, ameixa, maçã, pêssego e uva, o percentual de subvenção será de 60% sobre o valor do prêmio, naquelas microrregiões onde essas culturas possuem uma substancial importância econômica e/ou estejam sujeitas a maior vulnerabilidade climática, conforme parâmetros extraídos do zoneamento agrícola de risco climático, além do histórico de sinistros registrado.
 
A lista completa dos municípios prioritários pode ser lida no portal de internet do MAPA: http://www.agricultura.gov.br/politica-agricola/seguro-rural/municipios-prioritarios
 
Para aqueles produtores rurais enquadrados no Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural – PRONAMP e para os produtores de orgânicos, o percentual de subvenção também será de 60%, independente da cultura/atividade e da região produtora. Com o objetivo de incentivar a Política Brasileira de Florestas Plantadas, o percentual de subvenção para a modalidade de florestas será de 60%, independente da região produtora. Para todas as demais modalidades de seguro rural, independente da cultura/atividade subvencionável e da região produtora, o percentual de subvenção ao prêmio do seguro rural será de 40%.
 
A IMPORTÂNCIA E AS DIFICULDADES DO SEGURO AGRÍCOLA
 
O agronegócio brasileiro é o maior setor econômico do país se agrupado em todas as suas dimensões (produção, setor de consumo, processamento e distribuição). Cerca de 1/4 do PIB é composto pelo agronegócio. Além disso, quase 1/3 do emprego do país se associa de alguma maneira ao setor.
 
O sucesso da agropecuária brasileira não aconteceu sem custos consideráveis e com grandes instabilidades decorrentes de fatores inerentes a produção agrícola, mas também pelas transformações da macroeconomia no país e no exterior. É certo que o risco climático é inerente a agricultura. Reduções na quantidade de chuva provocam queda na produção agrícola. Geadas, granizo e vendavais, são elementos altamente nocivos às culturas e variações de temperatura e luminosidade acarretam perdas de produtividade.
 
Como a renda agrícola é produto da produtividade e do preço de venda, portanto, seja pelo risco de perdas na produção, seja por variações nos preços recebidos, o risco associado à perda de renda é bastante elevado em todo o país.
 
As políticas agrícolas foram criadas, no mundo e no Brasil, exatamente para tentar minimizar os impactos sociais da perda de rentabilidade da atividade agrícola. Políticas de preço mínimo, controle de estoques, crédito ao custeio, investimento e comercialização existem em todas as grandes e pequenas agriculturas do mundo. Entretanto, o principal instrumento de mitigação de risco na agricultura é o seguro rural.
 
Embora o seguro agrícola seja fundamental para assegurar estabilidade de renda aos produtores, existem poucos sistemas de seguro em larga escala no mundo. Ocorre que a natureza dos riscos e da atividade agrícola torna altamente improvável que o seguro rural surja espontaneamente. A ocorrência de perda simultânea em várias propriedades quando da quebra de safra em alguma região (eventos correlatos) é a realidade desse tipo de seguro, mas não do mercado de seguro em geral, sendo, portanto uma falha de mercado. Uma falha de mercado ocorre quando os mecanismos de mercado, não regulados peloo estado e deixados livremente ao seu próprio funcionamento, originam resultados econômicos não eficientes ou indesejáveis ao ponto de vista social. O seguro agrícola e as falhas de mercado na agricultura justificam a intervenção pública. Na verdade, o seguro agrícola um bom exemplo de falha de mercado e é por essa razão que os sistemas de seguro de larga escala existentes no mundo, o setor público tem papel vital na existência de um programa consistente de longo prazo.
 
Quais são os elementos que dificultam a criação de um sistema totalmente privado de seguro rural? Em primeiro lugar, é fundamental perceber que o cálculo exato da probabilidade de frustração de safra é bastante complexo. Esse cálculo depende não só de atributos físicos, mas também de habilidades humanas, como por exemplo, a produtividade depende da quantidade de chuva, da variância dessa chuva, da insolação, da incidência de pragas, da época de plantio, da tecnologia embutida na semente, nos insumos e nas máquinas. A capacidade gerencial e de detecção de problemas influenciam sobremaneira o resultado final. O tipo de solo e o relevo afetam a produção. Vê-se, portanto, que a probabilidade exata de frustração de safra é uma combinação de diversos elementos que são específicos a cada realidade, o que torna o cálculo do valor do prêmio a ser cobrado uma tarefa complexa.
 
Em segundo lugar, fica evidente no acima exposto, que o custo de monitoramento da evolução da safra é bastante elevado, mesmo considerando as novas tecnologias de imagem de satélite e monitoramento remoto. Além disso, pelas próprias características da sazonalidade da produção agrícola, existe uma concentração dos eventos muito grande, o que leva a dificuldades no dimensionamento da estrutura da empresa de seguros que muitas vezes tem que trabalhar com ociosidade elevada durante parte do ano.
 
Em terceiro lugar, em caso de sinistro nem sempre é fácil separar o que é consequência dos choques da natureza (seca, geada, chuva de granizo, novas doenças e pragas, etc.) daquilo que é fruto da má fé (risco moral) ou imperícia do produtor. É difícil na agricultura separar perfeitamente a ação do homem daquela da natureza. Nessas condições é fácil ver que situações de litigio entre a seguradora e o produtor podem facilmente acontecer. Todos esses elementos contribuem para tornar os custos de precificação e acompanhamento do seguro sejam de fato elevados.
 
Mas há um quarto elemento complicador no caso de seguros agrícolas que o distingue da maior parte de seguros como de vida, saúde, automóvel, dentre outros. Em todas essas outras modalidades de seguro os eventos são independentes entre os segurados. No caso da agricultura existe o fenômeno de catástrofe. Em geral o sinistro em uma propriedade encontra-se associado a diversas outras na mesma região dado que os fenômenos climáticos tendem a afetar regiões relativamente grandes. O risco de catástrofe faz com que o tamanho e a dispersão da carteira necessária para equilibrar custos e receitas das empresas seguradoras seja muito grande. É preciso uma carteira enorme para dar conta de uma quebra tal como a que ocorreu na safra 2011/12 no Rio Grande do Sul e Oeste do Paraná.
 
Note-se que o risco de catástrofe acaba sendo um importante inibidor da criação de uma carteira ampla de seguro. Existe um tamanho e dispersão mínimos iniciais necessários para conseguir sobreviver a eventos de catástrofe. Como não é possível imaginar que no ano 0 uma seguradora seja capaz de assegurar um número muito grande de produtores para compensar o risco de catástrofe, não há o surgimento espontâneo do mercado de seguro privado. Fica evidente que a falha de mercado precisa ser corrigida pelo Estado. Todos os países que possuem seguro agrícola em larga escala têm no Estado ator fundamental na construção do modelo. Os exemplos dos EUA e da Índia são emblemáticos nessa direção. Vale ressaltar que além deles, países como México, Espanha, Chile, Peru, Portugal, Equador, Colômbia, Uruguai, Áustria, Canadá, Paquistão, dentre outros a participação do Estado é fundamental no desenvolvimento do mercado de seguro agrícola.
 
O resultado desse conjunto de dificuldades inerentes ao mercado de seguro agrícola torna evidente a importância da presença do Estado como apoiador e indutor do desenvolvimento do mercado. Para construir um sistema amplo e robusto é preciso consistência no tempo da política pública de suporte ao setor. É fundamental manter o programa de subvenção ao prêmio no decorrer de um longo período de tempo. Apenas desta maneira será possível ampliar a carteira de seguro no país na medida em que progressivamente um número maior de produtores vai aderindo ao mercado de seguro rural. O crescimento da carteira permite que o risco percebido pela seguradora vá diminuindo no tempo e, dessa forma, reforçando a expansão do mercado. Qualquer instabilidade da politica pública com relação ao volume de recursos destinados a subvenção ao prêmio de seguro aborta o crescimento do mercado.
 
Lamentavelmente a política pública com relação ao mercado de seguro agrícola no Brasil tem se comportado de maneira errática e de baixa previsibilidade. Há grande incerteza quanto ao montante efetivo de recurso que será transferido para subvenção. É frequente no caso brasileiro que os valores orçados não sejam cumpridos. Atrasos na transferência de recursos constituem o dia a dia do mercado de seguros no Brasil. Essa realidade traz enorme insegurança às seguradoras privadas e é totalmente incompatível com a estrutura de mercado de seguro rural. Não é possível imaginar que o sistema possa ser ampliado se há insegurança aos recursos destinados à subvenção. É preciso então corrigir urgentemente a maneira como a política de subvenção vem sendo implantada na prática no Brasil. É preciso manter um planejamento de longo prazo para o setor de seguro.
 
A lição a ser tirada da experiência internacional é que o seguro rural levou muitas décadas para ser construído e conta permanentemente com o Estado subsidiando o prêmio às empresas privadas. Esses exemplos mostram também que dada a capilaridade e complexidade da produção agrícola o setor privado reduz o custo e aumenta a eficiência da gestão do seguro agrícola. Assim, pode-se notar que uma parceria entre setor público e privado é o modelo ótimo de construção de um sistema robusto de seguro rural.
 
Em síntese, a experiência internacional comprova que a presença do estado como elemento fundamental na construção de uma política sólida de seguro. A experiência histórica mostra que 1) sem o Estado a existência de um programa de seguro viável no longo prazo é dificultada e 2) demora muito para se construir uma política, portanto demora muito para que a política seja efetiva e consistente. Um bom exemplo nesse caso é os EUA, que hoje tem uma política de seguro bastante consistente como resultado de um longo e demorado processo de aprimoramento.
 
No caso brasileiro, a politica agrícola foi desenvolvida basicamente ao redor de três eixos inter-relacionados: crédito, garantia de preços mínimos e seguro rural. Não há dúvida que a predominância e o carro chefe da política agrícola brasileira foi e ainda é o crédito rural, por seu tamanho e abrangência. Existe ainda hoje uma política de preços mínimos combinada a estoques reguladores, mas que é bem menor do que quando de sua origem. Na prática, o seguro rural, na esfera da política pública brasileira sempre foi posicionado em uma escala de menor espectro.
 
No que se refere a seguro rural, foram criados programas distintos para atender diferentes escalas de produtores. Para atender os pequenos produtores, foi criado o Proagro há muitas décadas e, mais recentemente, para atender a agricultura familiar foi criado o PROAGRO Mais. Paralelamente construiu-se o programa de subvenção ao seguro rural para atender agricultores de maior escala não contemplados nos referidos programas. Aprovado em 2003, nota-se que o programa ainda não completou uma década e foi marcado por oscilações no orçamento e na disponibilização de recursos.

Fazendo uma análise conjunta das modalidades e mecanismos mitigadores do riscos climáticos (Proagro, Proagro Mais e Seguro Privado) é possível notar que parcela muito reduzida da produção da agricultura brasileira está protegida por alguma modalidade de seguro, estimasse apenas 18% da área agrícola.

Fonte: Agrolink

◄ Leia outras notícias