Publicado em: 10/12/2013 às 18:20hs
O que faz parte de um ajuste maior pelo qual o banco deve passar, com prioridade para infraestrutura e redução de programas com juros subsidiados é bem vista por especialistas ouvidos pelo Valor, mas pode impactar o mercado de crédito e o investimento produtivo nos primeiros dois ou três anos, pelo menos até que o setor privado e as empresas se adaptem à nova dinâmica.
Necessária - Para os especialistas, a redução do tamanho do BNDES, que este ano deve liberar volume recorde de R$ 190 bilhões, é necessária, e deve ajudar o governo a reduzir sua dívida pública, avaliada em 60% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, enquanto a média observada nos países emergentes é de 35% do PIB. Outro benefício será dar espaço à iniciativa privada e ao mercado de capitais, para que assumam parte da demanda por crédito que hoje é atendida pelo banco de fomento. No ano passado, segundo o próprio BNDES, a participação dos desembolsos do banco na formação bruta de capital fixo (FBCF) foi de 12,4%. O número exclui operações com capital de giro, exportação e mercado de capitais.
Contribuição - O Centro de Estudos do Ibmec, por sua vez, calculou que os desembolsos do BNDES tiveram contribuição para o investimento dentro do PIB de 19,7% nos últimos 12 meses encerrados em junho. O percentual é superior até ao verificado em 2009, no auge dos estímulos pós-crise, quando somou 19,5%. Para 2014, com a decisão do governo de reduzir os repasses ao banco, esse peso deve cair, pois o próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, já sinalizou que espera desembolsos no mínimo 20% menores que os deste ano.
Patamar - A ideia é levar os desembolsos do BNDES para o patamar de R$ 140 bilhões a R$ 150 bilhões já no ano que vem, e evitar novos repasses do Tesouro Nacional ao banco. De 2009 a meados de 2013, os aportes foram de R$ 300,25 bilhões. Consultados, especialistas não souberam afirmar qual seria a redução no percentual desse investimento gerado com financiamento do banco de fomento na economia com essa transição.
Dois anos - O economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, disse, recentemente, que dois anos é o período que os bancos privados e o BNDES devem levar para se ajustar ao atendimento da demanda por financiamento. O ex-secretário de política econômica do ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida, concorda com o prazo, e afirma que o BNDES deve levar de dois a três anos para ajustar seus recursos e fazer frente aos desembolsos sem necessidade de novos aportes do Tesouro. Segundo ele, esse deve ser também o intervalo necessário para que o banco de fomento eleve a taxa de juros de algumas linhas a um percentual mais adequado, sem que haja perda da capacidade de investimento das empresas.
Impacto - Qualquer tentativa do governo de acelerar esse processo, segundo Almeida, pode impactar a modernização industrial. "Os recursos do BNDES têm sido fundamentais para o investimento industrial. A indústria precisa disso para aumentar sua produtividade e ter maior capacidade de concorrer com o produto importado. Senão, ela vai depender mais do câmbio do que seria razoável", disse.
PSI - Até setembro o BNDES desembolsou R$ 62 bilhões por meio do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), linha voltada para o financiamento de máquinas e equipamentos. O volume é maior do que liberado em todo o ano passado, quando chegou a R$ 45,3 bilhões. "O volume cresceu este ano porque até o ano passado os empréstimos que poderiam ter alguma equalização de juros estavam limitados a um teto de R$ 200 bilhões. Esse ano isso foi elevado para R$ 312 bilhões, quase metade da carteira de investimentos do BNDES", disse o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Mansueto Almeida.
Juros - Atualmente, os juros do programa são de 3,5% ao ano, enquanto a taxa de juros no longo prazo (TJLP) está em 5%. Por isso o próprio banco de fomento já sinalizou, em comunicado ao mercado, que vai renovar o programa com taxas maiores a partir do ano que vem.
Ideal - "O ideal é que o processo de reversão da política [de captação via Tesouro], que permite oferta de crédito bastante em conta [como no caso do PSI], fosse feito gradativamente. É importante pensar em um processo onde o aumento da dívida pública seja substituído por um processo mais de mercado", observa Gomes de Almeida. Até lá, o BNDES deve buscar retorno dos investimentos que já fez, para elevar receitas e depender menos do governo, segundo ele.
Aumento da taxa - Em sua análise, seria importante o aumento da taxa do PSI também de forma gradativa. "Evidentemente, 3,5% ao ano é uma taxa muito baixa de subsídio, [poderia migrar] para alguma coisa como TJLP (5%)", exemplifica. Para Mansueto, há espaço para um aumento nos juros ainda maior, para algo em torno de 7%. "Mesmo que a taxa de juros do PSI seja um pouco acima da inflação, até 7% - o que faz uma grande diferença para o governo porque diminui a equalização de juros -, ela continuará a ser uma taxa muito atrativa", afirmou.
Mínimo - Caso a taxa de juros suba a esse patamar, e o investidor considere caro, segundo Mansueto, "é porque o investimento não é bom". Ele lembra que crédito subsidiado não garante crescimento sustentável. Em suas contas, a taxa mínima que o BNDES pode emprestar de forma a tornar seus desembolsos autossustentáveis é TJLP mais um spread para cobrir o risco. "Normalmente, é TJLP mais 1,5%. Então um empréstimo do BNDES, para não precisar de equalização de juros do Tesouro, seria uma taxa hoje por volta de 6,5% a 7%", calcula. "Se você tem um negócio em que a rentabilidade não chega a 3% ao ano, então é melhor não abri-lo", continuou.
Efeito - Para o economista do Ipea, se o governo fizer isso simultaneamente ao que está tentando fazer, de aumentar o investimento público via concessões e reduzir o custo Brasil, o efeito pode ser até positivo. "Mesmo que ocorra queda na taxa de investimento em um período de adaptação, eu não vejo problema. Porque se um país não tem como cobrar taxa de juros positiva para emprestar, então tem alguma coisa muito errada", observou Mansueto.
Fonte: Ocepar
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