Publicado em: 20/10/2025 às 08:00hs
A Reforma Tributária trará mudanças significativas para os produtores rurais brasileiros, especialmente para aqueles cuja receita anual supera R$ 3,6 milhões. Esses contribuintes passam a ser obrigados a recolher o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), novos tributos que substituem ICMS, ISS, PIS e Cofins. A alteração afeta diretamente a estrutura de custos do setor, já que produtores com faturamento inferior a esse limite poderão permanecer fora do regime, a menos que optem pela inscrição voluntária. O desenho da tributação reduz a média de alíquotas aplicadas ao agronegócio de 18% para 11,2%, mas o impacto prático dependerá do perfil de cada atividade.
O agronegócio tem participação relevante na economia brasileira: em 2023, respondeu por 24,73% da arrecadação nacional, o equivalente a R$ 897,46 bilhões. Essa representatividade explica a preocupação diante da nova sistemática tributária, que altera benefícios fiscais consolidados ao longo de anos. Até então, a legislação previa alíquotas zero de PIS e Cofins sobre diversos produtos, isenção para pessoas físicas e suspensões específicas no caso de pessoas jurídicas, como na venda de soja. No âmbito estadual, o ICMS contava com isenções e diferimentos aplicados a insumos como adubos, fertilizantes, calcário e gesso. A reforma extingue esses incentivos, já que a Constituição passou a vedar benefícios no âmbito do IBS.
Pela Lei Complementar nº 214/2025, a receita anual será apurada considerando-se a soma de todas as empresas ligadas ao mesmo contribuinte. Caso o limite de R$ 3,6 milhões seja ultrapassado, o produtor se torna contribuinte do IBS e da CBS a partir do segundo mês subsequente. A exceção ocorre quando o excesso é de até 20%, hipótese em que a obrigatoriedade só se aplica no exercício seguinte. Essa regra cria uma divisão clara entre pequenos produtores, que representam a maioria no país, e aqueles em escala mais ampla, que precisarão adaptar-se às novas exigências fiscais.
Apesar da expectativa de aumento de carga para quem hoje se beneficia de isenções e alíquotas reduzidas, a reforma também incorporou medidas de compensação. Entre elas, a criação de um regime específico para produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura, além de insumos agropecuários. Nesses casos, as alíquotas do IBS e da CBS foram fixadas em 60% do valor cheio, resultando em média de 11,2%. Embora alguns produtores enfrentem elevação de custos, outros terão tributação próxima à vigente, já que os dois novos tributos, assim como os anteriores, não são cumulativos.
Outro fator relevante é que as exportações permanecem imunes ao IBS e à CBS. O setor agropecuário foi responsável por 48,9% das exportações brasileiras em 2024, e a manutenção da imunidade garante competitividade internacional. A reforma também incluiu alimentos básicos como arroz, café, milho e carne na Cesta Básica Nacional, o que garante alíquota zero para esses produtos. Além disso, a importação de tratores, máquinas e implementos agrícolas por produtores com receita anual inferior a R$ 3,6 milhões também foi isentada.
As mudanças não se restringem à carga tributária. A adaptação às obrigações acessórias é outro desafio. O Brasil conta com mais de 5 milhões de produtores rurais, sendo 77% ligados à agricultura familiar. A escrituração digital, a emissão de notas e a integração a sistemas federativos exigem estrutura administrativa que muitos não possuem. Mesmo entre aqueles que já atuam como pessoa jurídica, haverá custos de adequação às novas rotinas fiscais. Essa transição pode se mostrar especialmente sensível para agricultores familiares e pequenos empreendimentos, que muitas vezes não dispõem de assessoria contábil.
O fim dos benefícios regionais concedidos no âmbito do ICMS também representa um ponto crítico. Muitos negócios foram estruturados com base em incentivos estaduais, cuja eliminação demanda revisão do planejamento tributário e da própria estratégia de operação. Ao longo da tramitação legislativa, diversas medidas foram negociadas para suavizar esse efeito, mas a retirada dessa possibilidade de atuação dos entes federativos impõe um novo paradigma para o setor.
No desenho atual, a carga tributária não será uniforme. Há produtores que, pela nova sistemática, enfrentarão elevação, sobretudo aqueles que antes estavam em regimes de alíquota zero. Por outro lado, há situações em que a reforma pode trazer neutralidade ou até mesmo alívio, com incidência próxima à atual, especialmente porque a redução média da alíquota foi calibrada para 11,2%. Essa diversidade de cenários reforça a necessidade de análise individualizada, considerando cadeia produtiva, porte da operação e regime de apuração adotado.
A Reforma Tributária inaugura um novo cenário para o agronegócio. O corte de R$ 3,6 milhões separa pequenos de grandes produtores, e a redução da alíquota média redesenha custos e margens. Entre riscos e compensações, o impacto será definido caso a caso. A tarefa imediata para o setor é entender como as novas regras dialogam com cada modelo de operação, de modo a assegurar eficiência fiscal e segurança jurídica em um ambiente tributário em transformação.
Fonte: Em Pauta
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