Publicado em: 05/12/2025 às 08:00hs
É em torno da mesa, entre um café, risadas e confidências, que se resolvem as questões mais delicadas da vida familiar. Antes das escrituras, das holdings e dos testamentos, existe a conversa. É nela que se expressam as vontades, se conciliam as diferenças e se definem, sem formalidades, os contornos de um legado.
No meio rural, essa dimensão afetiva é ainda mais marcante: a fazenda, o sítio, a gleba herdada do avô, tudo carrega não apenas valor econômico, mas também memória, identidade e pertencimento. Planejar a sucessão de um imóvel rural, portanto, é muito mais do que dividir bens... é perpetuar uma história.
O Direito Sucessório brasileiro, especialmente após o fortalecimento dos princípios da autonomia privada e da boa-fé objetiva, reconhece o poder das famílias de moldar sua própria sucessão patrimonial. A conversa antecipada sobre esses temas, muitas vezes tida como desconfortável, é instrumento necessário na prevenção de litígios.
Ao manifestar suas intenções de forma clara e dialogada, o patriarca ou a matriarca, não apenas evitam disputas futuras, mas também fortalecem os laços familiares e a confiança recíproca, fundamentos que nenhuma cláusula contratual substitui.
Como ensina MARIA HELENA DINIZ, “a sucessão, além de um fenômeno jurídico, é um ato de continuidade moral e familiar” ². Ou seja, o que se transmite não são apenas bens, mas valores, responsabilidades e afetos. Nesse sentido, cada vez mais cabe ao advogado exercer o papel de mediador e muitas vezes de tradutor de vontades, e não apenas de técnico redator de cláusulas.
É imprescindível que o advogado estimule a família a falar sobre o futuro de seu patrimônio em vida, com leveza e transparência, transformando o tabu da morte em exercício de cuidado e planejamento. A morte é a única certeza que temos nessa vida. Jesus Cristo, há dois mil anos, já nos ensinava: “Qual de vós, por mais que se esforce, pode acrescentar um só côvado à duração de sua vida?” (Mt 6, 27).
Planejar como sua família ficará caso você venha a faltar é um grande sinal de amor. Tal gesto, além de evitar que seus entes queridos comecem a litigar por assuntos que a conversa no cafezinho poderia evitar, permitirá que seu legado atravesse gerações. As conversas que um dia pareciam banais, à mesa, no alpendre, na varanda da fazenda... tornam-se as lembranças que sustentam o legado.
Ao bom advogado, portanto, cabe ajudar as famílias a transformarem conversas, muitas vezes, difíceis, em continuidade, e memórias, em segurança jurídica.
Porque, no fim, o verdadeiro patrimônio são as lembranças de nossos entes amados e saber que o entendimento construído em vida, mesmo depois da partilha, manterá unido quem ficou certamente é o propósito de cada líder de família.
Autor:
Marcos Vinícius Souza de Oliveira (@marcosdeoliveira.adv)
É advogado na Álvaro Santos Advocacia. Especialista em Direito Contratual e Sucessório. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás (UFG).
Fonte: Marcos Vinícius Souza de Oliveira
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