Agricultura Familiar

Nova secretaria quer promover agricultura familiar

Deputados e convidados manifestam confiança na pasta de Desenvolvimento Agrário, recém-criada, mas exigem investimentos


Publicado em: 04/05/2015 às 13:10hs

Nova secretaria quer promover agricultura familiar

A criação da nova Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário, por si só, não é garantia de avanços na agricultura familiar, mas pode ser um primeiro passo para valorizar o homem do campo, desde que o governo mantenha uma política continuada de investimentos no setor. Para isso, é necessário que o governo assegure recursos financeiros, a fim de vencer desafios como o da regularização fundiária, reforma agrária, comercialização e escoamento da produção e fixação dos jovens no campo. Esses foram alguns pontos de consenso discutidos na tarde desta quarta-feira (29/4/15), durante audiência pública da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Destinada a debater as políticas públicas para a agricultura familiar e a estrutura da nova Secretaria, a audiência contou com a presença do secretário Glênio Martins de Lima Mariano, que fez um diagnóstico do setor e traçou um perfil da agricultura familiar no Estado. Segundo o levantamento, Minas Gerais conta hoje com 551 mil estabelecimentos rurais, dos quais 437 mil (quase 80%) pertencem a agricultores familiares, correspondendo a 27% das áreas agricultáveis do Estado e 32% do Produto Interno Bruto (PIB). O diagnóstico diz ainda que o setor responde por 32% da produção de café, 44% de arroz, 47% de milho e 84% de mandioca.

O secretário reafirmou o compromisso do governador Fernando Pimentel no sentido de valorizar a agricultura familiar, lembrando que seu primeiro ato foi regulamentar, por meio de decreto, a Lei 20.608/13, que instituiu a Política Estadual de Aqusição de Alimentos da Agricultura Familiar. Do ponto de vista do marco legal, apontou outros dispositivos que beneficiam o setor, como as Leis 21.156 (institui a Política Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável da Agricultura Familiar), e a 18.374 (que dispõe sobre a política estadual de incentivo à formação de bancos comunitários de sementes de cultivares locais, tradicionais ou crioulos). Segundo ele, o fortalecimento do setor passa ainda pela criação de dois conselhos no âmbito da Secretaria: o Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável (Cedraf) e o Conselho Diretor Pró-Pequi.

Glênio Martins pontuou ainda alguns programas e ações que a secretaria planeja implantar, dentro das possibilidades orçamentárias do Estado, como o abastecimento da alimentação escolar por meio da agricultura familiar, o acesso do agricultor familiar ao crédito fundiário, o apoio às atividades extrativistas e o apoio à regularização fundiária das áreas ocupadas por quilombolas, comunidades indígenas e populações tradicionais.

Deputados questionam, mas dão voto de confiança

“Num primeiro momento confesso que não entendi bem a criação dessa secretaria, achava que bastava que se criasse uma subsecretaria na Secretaria de Agricultura, mas acabei aprovando o projeto da Reforma Administrativa e a criação da secretaria porque me detive um pouco mais nas propostas e percebi que o objetivo seria prestigiar a agricultura familiar”, disse o deputado Dilzon Melo.

O parlamentar observou, contudo, que não basta a criação da secretaria para que tudo dê certo. Segundo ele, a nova pasta tem um grande desafio pela frente, diante da crise por que passa o País. Previu que os grandes latifundiários vão querer fazer economia e reduzir custos e, por isso, começarão a demitir. Caberá, assim, aos agricultores familiares, “que têm unidade, união, compromisso e sentimento envolvido”, responder positivamente. Mas, para isso, observou, precisam ter acesso a crédito, escoamento garantido, preço mínimo para garantir a sua subsistência. “Vou dar mais um voto de confiança além do voto que dei no Plenário, mas gostaria que o secretário levasse ao governador a nossa reivindicação de que é preciso dar subsídios para esses agricultores, que são uns abnegados”. “Haverá dinheiro no orçamento?”, indagou. “Embora de oposição, tenho a clarividência necessária para dizer que nós devemos muito à agricultura familiar”, concluiu.

O presidente da comissão, deputado Fabiano Tolentino (PPS), agradeceu a presença do secretário e de sua equipe, louvou a criação da pasta e disse que os deputados estão atentos às necessidades do setor agrícola. Nesse sentido, informou que irá a Brasília para uma audiência com a ministra de Agricultura, Kátia Abreu, a fim de discutir saídas para o endividamento dos produtores rurais. Ele também defendeu maior empenho do governo do Estado no sentido de valorizar as escolas rurais, com um currículo específico para a realidade do campo, capaz de oferecer às crianças e jovens um aprendizado condizente com as atividades da região.

A proposta de Tolentino foi saudada com entusiasmo pelo deputado Doutor Jean Freire (PT). O parlamentar petista ainda comparou a criação da nova secretaria com a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário, à época do presidente Lula. Na ocasião, disse ele, o ministério foi muito criticado, mas, na verdade, representou um avanço para o campo em vários sentidos. “Assim como o ministério foi um salto para o País, acredito que a secretaria também vai ser um salto para o Estado”, disse.

Emidinho Madeira (PTdoB), falou das dificuldades dos produtores e trabalhadores rurais e disse esperar que a nova secretaria de fato promova a valorização do homem do campo. Ele aproveitou para anunciar o lançamento, nesta quinta-feira (30), durante audiência pública em Nova Resende (Sul do Estado) da Frente Parlamentar em Defesa da Cafeicultura, e disse contar com a presença do secretário no evento.

O deputado Nozinho (PDT), observou que, para o homem do campo, “produzir nem é tão difícil, difícil é a comercialização”. Por isso, disse, o setor vai precisar do apoio da secretaria. Tanto ele como Emidinho se colocaram à disposição para colaborar com a nova pasta no sentido de fortalecer os agricultores.

Antônio Carlos Arantes (PSDB) reforçou que “sem dinheiro não se faz nada”. Criticou o modelo de desenvolvimento econômico, que exige que se produza cada vez mais e que se ganhe cada vez menos, submetendo os produtores à frustrações com desordens de safra, de mercado, de preço. “O pilar que está ruído se chama preço justo, disse, manifestando a sua descrença de que se possa fazer grandes investimentos num ano de crise. “Neste ano, pelos orçamentos aprovados em Brasília e Minas Gerais, não dá”, disse. “É o ano de fazer a base, vamos ter que reinventar”.

Apesar de reconhecer as dificuldades financeiras do momento, o deputado Cristiano Silveira (PT) manifestou boa expectativa com relação ao desempenho da nova secretaria, cuja equipe saudou com entusiasmo. Disse acreditar que a ALMG tem tentado estabelecer um diálogo com o Poder Executivo, pois aprovou de forma unânime a criação da secretaria, segundo ele um gesto importante para os movimentos que atuam no campo.

Ele destacou a importância da agricultura familiar para a segurança alimentar, sem descartar o papel do agronegócio, um dos responsáveis pelo superávit da balança comercial do País. Mas alertou para as diferentes demandas de um Estado tão grande como Minas Gerais e admitiu que o governo terá que buscar saídas para os graves problemas financeiros.

Seu colega Rogério Correia (PT) destacou a criatividade dos agricultores familiares e disse que a Secretaria de Desenvolvimento Agrário terá que inovar para fazer frente aos desafios. Ele propôs que, junto com o lançamento do Plano Safra nacional, o governo do Estado faça também o lançamento do Plano Safra de Minas, para atender o pequeno produtor.

Subsecretário lembra que Brasil saiu do mapa da fome

O subsecretário de Estado de Agricultura Familiar, Luiz Ronaldo Carvalho, declarou-se “muito feliz” por ouvir de deputados de oposição “o reconhecimento da agricultura familiar. “Se hoje o Brasil saiu do mapa da fome, se deve em grande parte à criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário”, disse. Ele destacou importantes programas do governo federal para o avanço do campo, como o Luz pra Todos, o que, segundo ele, estancou um pouco a evasão para as grandes cidades. Mas disse que em Minas ainda falta iluminar 60 mil moradias. E apontou vários desafios, como a questão da regularização fundiária, da reforma agrária, da assistência técnica ao pequeno produtor, das políticas destinadas a manter os jovens no campo, entre outros.

O representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Marcos Vinicius Dias Nunes, citou vários aspectos que chamou de “gargalos” no fortalecimento da agricultura familiar, entre eles a questão da comercialização, da logística de transporte e distribuição dos produtos, além da carência de técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) para assistência técnica. “Desde fevereiro estamos sem recursos do Banco do Brasil”, disse, afirmando que a demanda de recursos, hoje, é da ordem de R$ 240 milhões, mas só R$ 30 milhões teriam sido liberados.

Fabiano Lucas, diretor da Emater, colocou a instituição à disposição dos agricultores, lembrando que o órgão tem 66 anos de experiência, e admitiu que há, de fato, uma grande carência de técnicos, já que a Emater conta com mais de 400 mil agricultores cadastrados para um número reduzido de técnicos. E alertou para a importância de se valorizar um segmento econômico tão importante para o Estado, lembrando que 32% do PIB de Minas Gerais vem da agricultura, mas que o orçamento destinado ao setor não passa de 1%.

Valdecir Lopes Viana, membro da Articulação do Semiárido, de Montes Claros, disse que para os agricultores do norte do Estado, o desafio é ainda maior devido à escassez de chuva. “Mesmo assim, disse, temos tido resultados muito positivos com os agricultores familiares, contribuindo para reduzir a evasão do campo”. Ele defendeu uma secretaria estruturada, capaz de viabilizar condições de armazenamento de água de chuva e de fomentar a agroecologia, e disse que a Asa quer contribuir com a secretaria.

Fabrício Vassali Zanelli, membro da Articulação Mineira de Agroecologia (AMA), lamentou que o Brasil tenha sido reconhecido, esta semana, como o campeão mundial de consumidor de agrotóxicos. Informou que há estudos da Fiocruz e de outros órgãos que comprovam casos de câncer e morte por contaminação de agrotóxico, fora os impactos ambientais na flora e na fauna. Ele também saudou a criação da secretaria, “uma demanda dos movimentos sociais”, e disse que o diagnóstico apresentado “mostra que a secretaria está em consonância com os movimentos”. Também defendeu reforma agrária e o protagonismo das mulheres na luta do campo.

Requerimentos encaminham quatro audiências públicas

Durante a reunião, foram aprovados requerimentos para a realização de quatro audiências públicas. O deputado Arlen Santiago (PTB) requer que seja realizada audiência em Montes Claros (Norte de Minas) para debater a renegociação das dívidas do Estado e a perda de produção na região, ocasionada pela crise hídrica. Thiago Cota (PPS) solicita debater, na reunião, a forma de atuação da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e da Fundação Rural Minas dentro da nova estrutura administrativa do governo.

Também foi aprovada audiência pública conjunta com a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável para debater a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), para avaliar a possibilidade de prorrogação do prazo definido. Assinam o requerimento os deputados Dilzon Melo (PTB), Cássio Soares (PSD), Paulo Lamac (PT) e Inácio Franco (PV).

A audiência pública solicitada por Rogério Correia (PT) terá por objetivo apresentar as conclusões e propostas de ações e políticas públicas destinadas aos jovens do campo, aprovadas no II Encontro dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais da Terceira Idade em Minas Gerais.

Fonte: Assessoria de Imprensa ALMG

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