Equídeos

Febre do Nilo Ocidental ameaça saúde de equinos no Brasil

Doença viral é grave, e a vacina, ainda não liberada no Brasil, é a única possibilidade de evitar a inutilização dos cavalos, ou mesmo os casos de morte destes animais


Publicado em: 19/10/2021 às 08:20hs

Febre do Nilo Ocidental ameaça saúde de equinos no Brasil

O caso recente da morte de uma mula com diagnóstico de Febre do Nilo Ocidental (FNO), registrado na região norte do Paraná, traz à tona a ameaça que a doença representa para a saúde de animais, especialmente equinos e aves, além de humanos no Brasil. Ocorrido em abril, na cidade de Porecatu, o caso se tornou público em 2 de setembro, quando foi confirmado pela Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar).

O animal de seis anos morreu após uma atividade de trabalho. Antes, teve sintomas como tremores e ataxia (perda ou irregularidade da coordenação muscular) nos quatro membros. A mula não resistiu por ter sido acometida por um caso mais grave da patologia. Por isso, é uma doença de importância considerável na equinocultura e que ainda não tem a vacina liberada no País.

“A priori, a mortalidade é muito alta dos cavalos e os que não morrem ficam com seqüelas permanentes, ou seja, inutilizados ou quase, para a função a que se destinam”, explica a médica-veterinária Claudia Leschonski, integrante da Comissão Técnica de Equideocultura do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo (CRMV-SP). Segundo ela, a FNO é semelhante a várias outras encefalites virais e o diagnóstico diferencial é fundamental. Isso porque nem sempre ele é fácil, diz.

Segundo Claudia, na maioria das vezes há uma confusão entre os diagnósticos. Os sintomas da depressão do sistema nervoso central, por exemplo, são similares tanto aos do vírus da FNO, como do herpes vírus equino, da encefalite equina e da raiva. “O diagnóstico sintomático é sugestivo, mas sempre será necessário o diagnóstico laboratorial complementar. É importante que tanto o médico-veterinário quanto o proprietário se conscientizem disso e se disponham a fazer esse tipo de investigação”, sugere.

A FNO não tem um tratamento específico, ela é apenas sintomática, como acontece com a maioria das viroses. Porém, não costuma ser eficiente, destaca a médica-veterinária do CRMV-SP. “Quando o organismo consegue combater o vírus, os animais ficam com sequelas neurológicas importantes”, diz.

Isso, por si só, na opinião de Claudia, destaca a importância da imunização. A vacina comercial para prevenção da FNO existe há pelo menos dez anos, contudo, diferentemente de outros países, não está disponível no Brasil. Nos Estados Unidos, onde sempre há casos, a aplicação de doses em todos os cavalos contra a doença é recomendada há muitos anos pela American Association of Equine Practitioners (AAEP) – que é a Associação Americana de Médicos-Veterinários de Equinos.

Para a especialista do CRMV-SP, não se pode falar em epidemia de FNO no País, no entanto, ela acredita na subnotificação de casos e que eles existem há muito tempo, possivelmente com diagnóstico confundido ao de outras encefalites. “Temos que insistir nos diagnósticos e ter o mapeamento claro da doença, mas, ao mesmo tempo, a vacinação tem que ser disponibilizada aos cavalos o quanto antes.”

Origem

O vírus da FNO foi identificado pela primeira vez em Uganda, em 1937, e se manteve por décadas restrita a países africanos, europeus e asiáticos. Chegou ao solo norte-americano em 1999 e causou um surto de grandes proporções, tornando-se amplamente estabelecido do Canadá à Venezuela.

Esta é uma zoonose transmitida por meio da picada de mosquitos infectados, principalmente do gênero Culex (conhecidos como pernilongo ou muriçoca), como a dengue ou febre amarela, explica o médico-veterinário Otávio Diniz, presidente da Comissão de Equideocultura do CRMV-SP. “Não existe transmissão de humano para humano ou de cavalo para cavalo. Equídeos e humanos são hospedeiros acidentais e terminais desse vírus.”

A disseminação da FNO acontece principalmente por meio de aves migratórias, capazes de reintroduzir o vírus em determinadas áreas, causando surtos esporádicos após circularem por regiões endêmicas. “Outra forma de ocorrência é pela importação de aves infectadas ou ainda a introdução acidental de mosquitos infectados. Dessa maneira, a doença pode entrar em países até então considerados livres do problema.”

Proteção

O médico-veterinário do CRMV-SP aconselha reduzir a exposição dos equídeos aos vetores, com uso de repelentes, confinamento em baias com portas e janelas teladas, e mantê-los distantes de localidades onde exista infestação por culicoides. “Os animais devem ser isolados, dentro da cocheira e com as luzes apagadas, no período de maior atividade dos mosquitos, que costuma ser entre 16h e o amanhecer.”

Os humanos também devem evitar a exposição aos mosquitos, com uso de mosquiteiros nas camas e repelentes. Os riscos são reduzidos com medidas, como evitar água parada; evitar locais sem saneamento básico; manter telas em janelas e portas; não despejar lixo em valas, valetas, margens de córregos, rios e riachos; e usar inseticidas e larvicidas.

“É importante evitar manusear animais mortos quando possível. Se houver a necessidade, usar luvas duplas de procedimento, para proteger a pele de sangue ou outros fluidos corporais”, acrescenta Diniz.

Imunidade

No caso desta infecção, a causa é o vírus do gênero Flavivirus, família Flaviviridae, assim como os vírus da dengue e da febre amarela. Significa, então, que os humanos, diferentemente dos equinos e aves, são mais protegidos de casos mais graves da doença no País, ao passo que a população brasileira tem muita imunidade para Flavivirus e estudos sobre a FNO apontam que há uma reatividade cruzada entre eles.

Casos humanos da doença foram registrados todos no Estado do Piauí - dez pessoas foram diagnosticadas entre 2014 e 2020. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 80% das pessoas não apresentam sintomas. “Quando eles ocorrem, não apresentam sinais clínicos importantes. O paciente pode ter febre e mal-estar”, afirma o médico-veterinário.

As formas graves da doença atingem o sistema nervoso central, com meningite e encefalite, de um em cada 150 infectados. Os sintomas podem ir de febre alta e rigidez da nuca a convulsões, coma e paralisia. Conforme o Ministério da Saúde, as formas mais graves ocorrem com maior incidência em pessoas com idade acima dos 50 anos.

O tratamento é sintomático para redução de febre e outros sintomas nos casos leves, e hospitalização para tratamento de suporte nos mais graves.

Fonte: Apex Agência

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