Análise de Mercado

Acordo Mercosul-União Europeia: possíveis impactos no setor de frutas e hortaliças

Depois de anos de negociação, o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) deve sair do papel


Publicado em: 30/07/2019 às 12:20hs

Acordo Mercosul-União Europeia: possíveis impactos no setor de frutas e hortaliças

Enquanto alguns produtos terão isenção de tarifas na totalidade do volume comercializado entre os blocos, outros terão cotas preferenciais fixas.

No caso do agronegócio, tudo indica que o acordo será muito benéfico para o Brasil, já que cerca de 99% das exportações nacionais terão as tarifas zeradas ou parcialmente reduzidas e, no caso da fruticultura brasileira, o acordo será ainda mais importante, porque nossos principais concorrentes nos envios à UE (como Peru, Chile e México) já são isentos de tarifas para exportação de frutas. Assim, o acordo elevará a competitividade do Brasil nos envios ao bloco, já que, segundo a Abrafrutas (Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados), cerca de 60% das frutas exportadas pelo Brasil são enviadas à União Europeia, atualmente com impostos que variam entre 4% e 14%.

É importante lembrar, contudo, que o acordo será uma via de mão dupla: ao mesmo tempo em que os produtos do Mercosul terão redução de tarifas para a UE, os produtos do bloco europeu também terão entrada facilitada no Brasil – e isso inclui frutas e hortaliças in natura e industrializados.

FRUTAS E HORTALIÇAS IN NATURA – No caso de frutas de que o Brasil é basicamente exportador (como manga, melão, melancia, mamão, citros e banana), o acordo deve ser bastante favorável, ainda que alguns não tenham desgravação imediata da tarifa – limões e limas, melancias e melões, por exemplo, devem ter as tarifas zeradas em sete anos. Segundo a Abrafrutas, não devem haver cotas para a exportação de frutas – sendo a isenção aplicada à totalidade enviada pelo Brasil. Assim, o ganho de competitividade pode, inclusive, motivar uma maior participação das vendas externas frente às internas – das frutas citadas acima, apenas o melão tem grande porcentagem da produção destinada à exportação.

No caso das frutas de que o Brasil é produtor, mas também é importador (como maçã e uva), o acordo pode elevar o market share da UE nas importações brasileiras – a participação da União Europeia, para estas frutas, ainda é pequena: segundo a Secex, em 2018, para a maçã, apenas 15% do volume importado foi originário do bloco, enquanto para a uva, menos de 2% das compras brasileiras vieram da UE. Para maçãs, ainda que, no geral, o acordo seja positivo (já que o Brasil exporta em épocas de baixa oferta europeia, e vice-versa), podem haver prejuízos ao mercado nacional em anos de produção elevada na UE – já que as frutas europeias devem ter preços competitivos.

Para as hortaliças in natura, é a importação que merece destaque, principalmente de cebolas e alho. Contudo, novamente o volume da UE é pequeno: apenas 4% do alho e 14% da cebola importados pelo Brasil em 2018 vieram do bloco europeu, segundo a Secex. Para estes, novamente o impacto pode ser a elevação do market share dos produtos europeus, principalmente no caso da cebola, já que ela passou a integrar, desde 2018, a Letec (Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum), com taxação de 25% no ano passado, 20% em 2019 e 15% em 2020, enquanto a Argentina é isenta para envios ao Brasil por fazer parte do Mercosul.

FRUTAS E HORTALIÇAS PROCESSADAS – As frutas e hortaliças processadas, tanto as importadas quanto as exportadas pelo Brasil, também serão afetadas:

Suco de laranja: O Brasil é o maior exportador da commodity, sendo a UE o principal destino. Segundo a CitrusBR, as tarifas para entrada de suco de laranja brasileiro no bloco europeu variam entre 12% e 15%, a depender das especificações do produto. Portanto, a redução gradual das tarifas sobre o suco de laranja nacional na Europa pode compensar, em parte, a possível perda da competitividade da commodity em relação a outros tipos de sucos e bebidas no bloco.

Vinhos: Alguns terão isenção de tarifas em até oito anos, o que pode permitir que vinhos europeus cheguem ao consumidor brasileiros a valores mais atrativos – o que pode diminuir a competitividade do produto nacional. Além disso, pode elevar o market share dos vinhos europeus frente a outros importados – segundo a Secex, em 2018, 25% dos vinhos importados pelo Brasil vieram do bloco.

Batata pré-frita congelada: Ainda que o Brasil esteja elevando a sua produção interna, a maior parte da batata pré-frita congelada consumida no País é importada, sendo que, em 2018, 26% foram originárias da UE, segundo a Secex. Atualmente, a batata pré-frita importada tem tarifa de 14%, e, para este produto, além de elevar o market share europeu, o acordo pode limitar ainda mais a competitividade da batata processada brasileira – visto que a congelada importada já chega ao Brasil a preços bastante competitivos.

Polpa de tomate: Atualmente, as processadoras brasileiras de tomate importam parte de sua necessidade de polpa de tomates (não apenas por não haver produção interna suficiente, mas também por questões estratégicas e de qualidade) – em 2018, 19% das importações vieram do bloco europeu. Este, portanto, seria mais um caso de possibilidade de aumento do market share da polpa europeia.

No geral, o acordo de livre comércio deve trazer grandes benefícios ao setor de frutas e hortaliças, sejam in natura ou industrializados. Na maioria dos casos, os impactos não são imediatos, principalmente aqueles que terão redução gradativa das tarifas.

Consumidores também tendem a ser favorecidos por produtos mais baratos, principalmente nos casos daqueles pouco produzidos no Brasil – frutas exóticas, sucos de superfrutas (com apelo funcional) etc. Vale destacar, contudo, que o acordo comercial ainda precisa ser ratificado pelo parlamento dos países-membros de ambos os blocos, cenário que ainda pode se estender pelos próximos dois anos.

Fernanda Geraldini Palmieri - Pesquisadora da área de HF do Cepea