Gestão

O Consumidor e as Hortaliças vendidas em Brasília/DF


Publicado em: 26/05/2011 às 15:44hs

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O mercado, as empresas e os consumidores mudam a todo o momento, com isso todas as condições ambientais também se alteram ano após ano. Dessa maneira, para que os diversos agentes do processo produtivo sempre estejam antenados a essas alterações é preciso conhecer/entender as diferentes dimensões ambientais que cercam os consumidores. Fica clara, então, a importância de estudar o cliente e, a partir desse conhecimento, planejar as estratégias de mercado. Não é por outro motivo que durante as últimas décadas as discussões sobre a rastreabilidade, certificação, cultivo orgânico e alimentos funcionais têm ganhado força. Os debates sobre as formas de diferenciação do produto, inserção social e produção sustentável têm a cada dia alcançado um número maior de estudiosos e se alicerçado nas demandas sociais.

Nesse cenário o consumidor é peça fundamental. Não é difícil entender que sem figura do cliente, consumidor ou usuário não existe a produção. Mas se há produção, que essa seja direcionada pelos desejos e necessidade do maior beneficiário do processo produtivo, o consumidor.
 
Qualidade e Consumidor

Ao se falar em qualidade é importante entender que várias foram as tentativas de definir esse conceito. Crosby em 1979, por exemplo, definia qualidade como a conformidade com os requisitos de projeto. Contudo, com o passar do tempo, passou a definir qualidade como a conformidade com os requerimentos dos clientes (CROSBY, 1992). Para Feigenbaum (1994), qualidade significava propriedade síntese de múltiplos atributos do produto (físico e ampliado) que determinam o grau de satisfação do cliente. Ou seja, outro elemento importante foi agregado ao conceito de qualidade: o cliente, consumidor ou usuário. Fica óbvio, portanto, que os consumidores avaliam a qualidade dos produtos ou serviços e os comparam com aqueles que eles desejariam.

Surge então outro conceito que geralmente é utilizada junto com a definição de qualidade, a satisfação. Embora muito se discuta sobre a satisfação, Kotler em 1998 a define como sendo o sentimento de prazer ou de desapontamento resultante da comparação do desempenho esperado pelo produto (ou resultado) em relação às expectativas da pessoa. Ainda de acordo com esse autor, conquistar novos clientes custa entre cinco a sete vezes mais do que manter os já existentes. Sendo assim investir no aumento das vendas e na redução das despesas implica esforçar-se para entender e reter clientes.

Não só no Brasil, mas no mundo os consumidores estão cada vez mais exigentes quanto à qualidade e inocuidade dos produtos alimentícios que adquirem. Na Europa, EUA e Japão, os consumidores buscam informações a respeito de novos produtos, estão interessados em questões relacionadas à preservação do meio ambiente, saúde, aspectos sensoriais e a ausência de contaminantes. Pesando nisso, a Universidade de Brasília - UnB, com o intuito de conhecer melhor o consumidor de hortaliças, desenvolveu uma pesquisa de mercado que atendesse o segmento produtivo da região.

A Pesquisa e o consumidor de Brasília

Os consumidores foram entrevistados nas proximidades das gôndolas de hortaliças dos supermercados e hipermercados da cidade de Brasília/DF (Plano Piloto). Foram entrevistados 397 consumidores no ano de 2009. Nessa pesquisa objetivou-se, além da caracterização do consumidor, a obtenção de dados sobre a percepção da qualidade do produto sob o ponto de vista do cliente. Os consumidores foram convidados a opinar sobre atributos e características voltadas à produção e consumo de hortaliças, informando sua percepção sobre a importância de cada um segundo a seguinte escala: sem importância (0); pouco importante (1); neutro (2); importante (3) e muito importante (4). Os resultados foram tratado, analisado e se apresentam neste artigo da seguinte forma:

Características demográficas

De acordo com essa pesquisa, foi observado que 59,49% dos entrevistados são do gênero feminino e 40,51% do gênero masculino. Embora, mudanças estejam ocorrendo em diversos países do mundo, no Brasil a mulher é ainda a responsável pela compra dos alimentos, enquanto na maioria dos lares o homem ainda desempenha o papel de provedor.

Verificou-se também na pesquisa que 67,6% dos consumidores de hortaliças pertencem a uma faixa de renda alta, ou seja, recebem mais de 5.000 reais mensais. Apenas 7,8% dos entrevistados recebem menos de 1.500 reais mensais. Os demais entrevistados pertencem às faixas intermediárias, recebendo entre 1.500 e 5.000 reais mensais. Levantamento realizado pelo IBGE (2005) relata que o rendimento médio mensal no DF é de R$ 3.241, enquanto a média nacional é de R$ 1.789. Os entrevistados, em sua maioria, se encontram em um grupo privilegiado de renda, acima da média observada no Distrito Federal.

Quanto ao nível de escolaridade, conforme o IBGE (2000), apenas 4,1% da população brasileira tem formação educacional em nível superior. No entanto, verificou-se que 55,8% dos entrevistados possuem, no mínimo, nível superior completo. Desse total, 17,6% possuem pós-graduação. Portanto, os consumidores de hortaliças do Distrito Federal são pessoas instruídas e esclarecidas, sem, contudo, estarem diretamente ligadas à área agrícola. Nota-se que é um público diferenciado quando se está falando da população brasileira como um todo.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2000), 60% da população brasileira têm menos de 29 anos de idade. Conforme estudos da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (CODEPLAN, 2008), fato similar ocorre no DF, onde a população é predominantemente jovem, apresentando idade média inferior aos 27 anos. Em consonância com isso, o estudo demonstrou que a grande maioria dos entrevistados (69,2%) encontra-se na faixa etária de 26 a 55 anos, sendo que aproximadamente 25,7% estão na faixa de 36 a 45 anos. Portanto, os entrevistados se encontram no grupo de pessoas economicamente ativas, escolarizadas e de alta renda, responsáveis pela escolha do alimento mais adequado para sua família.

Percepção dos consumidores sobre os atributos de qualidade


De acordo com a média que variava de 0 a 4, os cinco aspectos considerados mais importantes em ordem de prioridade para os consumidores de Brasília/DF são: sanidade (3,82), preservação do produto (3,81), as características sensoriais - odor, sabor e textura - (3,67), conteúdo nutricional (3,51) e o preço (3,43).

Médias atribuídas pelos consumidores do Distrito Federal aos aspectos e atributos de qualidade das hortaliças, segundo sua importância. Brasília/DF, 2009.

Atributos Entrevistados Mínimo Máximo Média* Desvio Padrão
Sanidade (contaminantes) 354,00 2,00 4,00 3,82 0,409
Preservação do Produto 344,00 1,00 4,00 3,81 0,421
Sabor/odor/textura 352,00 0,00 4,00 3,67 0,563
Conteúdo Nutricional 348,00 0,00 4,00 3,51 0,619
Preço 353,00 0,00 4,00 3,43 0,942
Fraude 344,00 0,00 4,00 3,38 0,799
Disponibilidade do Produto 348,00 0,00 4,00 3,34 0,744
Sistema de cultivo (poluição ambiental/contaminação) 343,00 0,00 4,00 3,23 0,786
Praticidade (tamanho/embalagem) 341,00 0,00 4,00 2,97 1,030
Dia de Compra 350,00 0,00 4,00 2,86 1,342
Origem 354,00 0,00 4,00 2,78 1,248
Sementes de OGM's/transgênicos 351,00 0,00 4,00 2,74 1,053
Disponibilidade do produto na banca/prateleira 344,00 0,00 4,00 2,53 1,207
Certificação/rastreabilidade 342,00 0,00 4,00 2,38 1,224

*Escala de notas: Sem importância – 0, Pouco importante – 1, Neutro – 2, Importante – 3, Muito importante – 4

O risco de contaminação das hortaliças por defensivos e microrganismos é muito importante para os consumidores entrevistados. Não é por outro motivo que as estatísticas mercadológicas mostram que a agricultura oriunda de sistemas agrícolas sustentáveis é uma das principais tendências no mundo. No mercado mundial nota-se uma tendência de aumento no consumo de produtos orgânicos principalmente em países como Estados Unidos, Reino Unido, Suíça, Alemanha. De acordo com os estudos da Federação Internacional de Movimento de Agricultura Orgânica (IFOAM) o mercado mundial europeu vem apresentado crescimento na demanda por produtos orgânicos da ordem de, aproximadamente, 40% ao ano (CHOUDHURY E COSTA, 2003).

No mercado Inglês, os consumidores estão desejosos por novas opções de alimentos. Eles já se consideram supridos quantitativamente, restando apenas o fator qualidade como novo diferencial a ser oferecido. Por essa razão, os produtos oriundos de sistemas orgânicos de cultivo apresentam um crescimento de 500% em apenas um ano. (MAMEDE,1999).

O Brasil também, no mesmo sentido do resto do mundo, apresenta hoje uma demanda por essa classe de produtos superior à oferta. Essa demanda se concentra basicamente em produtos frescos (in natura) como frutas e hortaliças que representam 2% do total comercializado pelas redes de supermercados no país (AGRIANUAL, 2001).

Ademais, de acordo com levantamentos dirigidos por Choudhury e Costa (2003), verifica-se uma tendência do consumidor em privilegiar os seguintes aspectos: Aspectos relacionados à saúde; Conservação do meio ambiente; e, Características sensoriais do produto. Colabora, portanto, para isso o fato das características sensoriais terem recebido a terceira maior nota de importância. As características sensoriais indicam que os consumidores costumam optar por produtos com características mais direcionados a sua preferência particular. E também optam por produtos que garantam uma adequada qualidade nutricional. Ou seja, os consumidores também estão preocupados com o conteúdo nutricional, principalmente, aqueles que buscam nas hortaliças fontes mais saudáveis de alimentação (quarta maior média de importância).

O fator preço é apenas o quinto colocado entre os aspectos de importância no momento da aquisição do produto. Como foi observado que 67,6% dos entrevistados possuem renda familiar superior a 5.000 reais mensais e pertencem a um grupo de elevada renda, interpretou-se que o preço, apesar de importante, não figura como sendo primordial na decisão de compra de hortaliças em Brasília/DF.

Em contra partida, os aspectos considerados menos importantes pelos consumidores foram: certificação/rastreabilidade (2,38), disposição do produto na banca/prateleira do supermercado (2,53), sementes de organismos geneticamente modificados ou transgênicos (2,74), origem do produto (2,78), dia de compra (2,86) e praticidade (2,97). Entre os aspectos relacionados como menos importantes encontram-se temas que têm sido freqüentemente tratados pela mídia, pelos legisladores e pelos setores produtivos como certificação/rastreabilidade e transgênicos. O que parece demonstrar que, apesar das grandes preocupações mundiais com esses temas, o consumidor de Brasília não atribui a esses requisitos a mesma importância que os governos os dão. De acordo com este trabalho, para os consumidores de hortaliças a certificação/rastreabilidade e a transgenia oscilam entre a faixa de valores próxima da neutralidade.

Além disso, devido à grande organização logística e distribuição desses produtos, o fator dia de compra é hoje o quarto menos importantes. Enquanto que a praticidade, apesar de significar um atributo de grande relevância para aquisição de outros produtos, para as hortaliças parecem pouco influenciar.

REFERÊNCIAS

  • AGRIANUAL; Mercado crescente e certificação de produtos orgânicos. Agrianual 2002, São Paulo, p. 19-21, 2001.
  • CHOUDHURY, M. M e COSTA, T. S; Mercado e produção de hortaliças orgânicas. Embrapa Semi-Árido. Petrolina – PE, 2003.
  • CODEPLAN. Companhia de Planejamento do Distrito Federal. 2008. Disponível em: . Acesso em 03 março de 2009.
  • CROSBY, P. B. Quality is free, New York: New American Library, 1979.
  • CROSBY, P. B. Zero Defects. Quality Progress, fevereiro, 1992.
  • IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2007 . Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007 >. Acesso em 03 março de 2009.
  • IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2005 . Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/series_estatisticas >. Acesso em 03 março de 2009.
  • IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2000. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/censo >. Acesso em 03 março de 2009.
  • KOTLER, P. Administração de Marketing: Análise, planejamento, implemetação e controle. 5ªed. São Paulo: Atlas, 1998.
  • MAMEDE, N. Opção pelo novo. Agroanalysis, Rio de Janeiro, v. 19, n.1, p.44, janeiro de 1999.
  • MARTINS, G. A. Estatística geral e aplicada. Editora Atlas, 2ª edição, São Paulo, 2002. p. 157-200.

Isaac Leandro de Almeida - Mestrando em Agronegócio. isaac.leandro@embrapa.br.
Ana Maria R Junqueira - Professora da Universidade de Brasília. anamaria@unb.br.

Fonte: Embrapa Transferência de Tecnologia

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