Clima

Bolsonaro muda de tom, mas precisa provar que fala sério em relação a meio ambiente

O discurso do presidente Jair Bolsonaro na Cúpula de Líderes Climáticos se manteve no script da carta enviada ao presidente Joe Biden há poucos dias


Publicado em: 23/04/2021 às 19:00hs

Bolsonaro muda de tom, mas precisa provar que fala sério em relação a meio ambiente

O discurso do presidente Jair Bolsonaro na Cúpula de Líderes Climáticos se manteve no script da carta enviada ao presidente Joe Biden há poucos dias. O tom não foi agressivo como em suas duas participações na Assembleia das Nações Unidas. O conteúdo pode ser considerado correto, com pontos a serem debatidos. O maior problema do discurso de Jair Bolsonaro é que vem de Jair Bolsonaro.

Se o primeiro ponto é a falta de credibilidade crônica, o segundo é que desmatamento e crise climática não se combatem com estratégias de comunicação. A Amazônia é visitada todos os dias por satélites que indicam com precisão onde se desmatou e se há incêndios. Contra fatos não há argumentos.

Os fatos são conhecidos mundialmente -- o desmatamento na Amazônia estourou com Bolsonaro e seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Contra a emergência climática é preciso mostrar ação política, ter planejamento e políticas públicas. O Brasil não tem feito nada disso.

Não adianta repetir duas vezes que o Brasil participa com menos de 1% das emissões históricas de gases-estufa, que tem uma das matrizes energéticas mais limpas, que é pioneiro no etanol.

Bolsonaro mina sua credibilidade até quando tenta acertar. No discurso em inglês disse que a meta brasileira de corte de gases-estufa para 2030 "it????´s up to 40%". No discurso escrito está certo - corte de 37% em 2025 e 43% até 2030. Não se sabe quem vacilou, mas não é de bom tom arredondar metas climáticas em discursos presidenciais em eventos como este. É disso que se trata.

O presidente fez questão de dizer que o Brasil é detentor da maior biodiversidade do planeta e potência agroambiental, e que "está na linha de frente do enfrentamento ao aquecimento global".

Bolsonaro não tinha constrangimento algum em se mostrar negacionista climático ou cético até ontem. O país esteve na linha de frente do enfrentamento à crise climática até ele assumir.

A fórmula da explosão do desmatamento é conhecida e começou na campanha presidencial -- retórica permissiva a madeireiros e garimpeiros e desmonte dos órgãos ambientais de fiscalização. Ele agora prometeu fortalecer estes órgãos. A ver.

O presidente brasileiro, como os que o precederam, apontou que a maior causa do aquecimento é a queima de combustíveis fósseis ao longo dos últimos dois séculos. Verdade. O Brasil sempre adotou a postura de que a culpa pela crise climática é dos países ricos, que se desenvolveram à custa das florestas.

A diferença é que os outros mandatários brasileiros, de José Sarney a Dilma Rousseff,fizeram esforços sérios para combater a ilegalidade na Amazônia e conter o desmatamento. Alguns conseguiram mais que outros. Bolsonaro e Salles, até agora, trilharam o caminho contrário.

O presidente também destacou que é preciso melhorar a vida dos mais de 23 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia e falou em bioeconomia. Ninguém discute isso. O problema é o cinismo que ambas as frases embutem para quem acompanha os movimentos do governo.

Bolsonaro destacou a importância dos mercados de carbono, que o Brasil pode fazer mais se ajudado, que o país está aberto à cooperação internacional. Tudo perfeito. Não fosse ele o presidente do país nos últimos dois anos.

No mesmo dia em que Bolsonaro enviou a carta ao presidente Joe Biden, Alexandre Saraiva, o superintendente da Polícia Federal que fez a maior apreensão de madeira da história, foi destituído. O ministro do Meio Ambiente do Brasil correu a defender os madeireiros em um dos episódios mais bizarros dos últimos tempos.

Quem acreditará nas promessas de seu governo na Cúpula dos Líderes Climáticos?

Fonte: AGÊNCIA UDOP

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