Publicado em: 01/08/2025 às 10:40hs
Em artigo assinado pelos advogados Charlene de Ávila e Néri Perin, especialistas destacam que nenhuma nação pode ser considerada soberana ao abandonar seus agricultores. A análise critica duramente o atual modelo de políticas públicas voltadas ao campo, apontando para um colapso silencioso que atinge milhares de produtores rurais no Brasil.
Apesar dos recordes de exportação e da alta produtividade que posicionam o agronegócio como um dos pilares da economia nacional, a realidade vivida por muitos produtores rurais é alarmante. Eles enfrentam um sistema de crédito rural cada vez mais inacessível, com exigências rigorosas, prazos curtos e taxas de juros que ultrapassam 20% ao ano — um cenário insustentável diante dos riscos climáticos, das flutuações cambiais e do aumento nos custos dos insumos.
Segundo os autores, o que ocorre no campo não é apenas uma crise pontual, mas um colapso moral, estrutural e político. O retrato de um agronegócio moderno e competitivo funciona como maquiagem ideológica para encobrir o abandono do agricultor, elo mais frágil da cadeia produtiva. O sistema, afirmam, se sustenta explorando justamente quem planta, colhe e alimenta a população.
A análise levanta uma reflexão urgente: quem realmente colhe os lucros do agro? Enquanto grandes grupos exportadores e instituições financeiras são beneficiados pelo mercado global, o produtor rural, verdadeiro pilar da segurança alimentar nacional, é deixado à própria sorte. A distância entre a propaganda do “agro é pop” e a realidade no campo é cada vez maior.
A crise não surgiu de forma inesperada. Ela é resultado de décadas de negligência política, dependência de capital especulativo e um modelo agroexportador que marginaliza pequenos e médios produtores. O atual cenário é o desfecho de um processo de enfraquecimento institucional, onde o produtor rural foi transformado em sobrevivente.
Os autores denunciam que o sistema atual é composto por crédito travado, juros abusivos, renegociações de dívidas que mais prejudicam do que ajudam e a quase inexistência de assistência técnica e jurídica. Essa estrutura perversa se sustenta sobre três pilares:
O sistema agroindustrial, apontam os autores, impõe contratos desfavoráveis e margens de lucro mínimas. O produtor até escolhe o que plantar, mas não define quanto vai receber — nem quanto pagará por insumos que sobem ao sabor do dólar, como sementes, defensivos e máquinas.
Em muitos casos, produtores estão recorrendo a pedidos desesperados para evitar a perda de maquinário, leilões judiciais e a falência. A culpa pelo fracasso, no entanto, não é individual, mas reflexo de um sistema que empurra o agricultor para a inadimplência.
São os agricultores — homens e mulheres que enfrentam seca, geada e dívidas — que sustentam a produção nacional, mesmo sem acesso a crédito ou garantias. No entanto, são os primeiros sacrificados quando o sistema exige eficiência em nome do lucro.
O artigo conclui que a crise atual não será resolvida com anúncios sazonais de planos de safra ou campanhas publicitárias. São necessárias reformas profundas no modelo de financiamento agrícola, proteção contra abusos bancários, valorização da agricultura nacional e, acima de tudo, uma mudança na narrativa que define o sucesso do agro apenas em números de exportação.
"O silêncio do campo precisa ser rompido", finalizam os autores. "Porque ele é construído com dor, dívida e desespero. Nenhuma nação que abandona seus agricultores pode se dizer soberana."
Fonte: Portal do Agronegócio
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