Publicado em: 15/10/2025 às 08:00hs
“Mas é tudo veneno, tio!?!” — foi assim que meu sobrinho reagiu quando conversávamos sobre o uso de agroquímicos nas lavouras. A observação me levou de volta aos tempos de graduação, em Florianópolis, quando ouvi, em aula, uma frase que me acompanha desde então: “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose” (Paracelso, médico suíço-alemão que viveu no século XVI).
A experiência que acumulo ao longo desses 18 anos trabalhando diretamente com o agricultor mostra que a adoção de Boas Práticas Agrícolas é a chave para o uso de insumos e tecnologias como ferramentas de cuidado, eficiência e segurança.
Sou gaúcho de nascimento (Sarandi/RS), catarinense de criação (bons anos em Xanxerê/SC), italiano por descendência, paulista de profissão (toda a trajetória profissional vivida em cidades de SP), brasileiro por paixão e cidadão do mundo por oportunidade. Essa diversidade me ensinou algo essencial: respeitar pessoas, culturas, costumes e escolhas. Esse respeito também está presente no fundamento das Boas Práticas Agrícolas, que leva à tomada de decisões responsáveis e são caminho efetivo para o produtor que as adota e o entorno da sua propriedade.
Mas, retomando a máxima de Paracelso, o cotidiano nos oferece exemplos eloquentes. Ninguém deseja adoecer; por isso tomamos precauções: vacinas, vitaminas, cuidados sazonais. Se diante de uma queda brusca de temperatura ou de uma oscilação climática em viagens surgirem sintomas, procuramos um médico. Ele avaliará o quadro, solicitará exames e, quando necessário, prescreverá tratamento com posologia – duração, doses e intervalos e duração determinadas – aprovada por agências reguladoras - no Brasil, a ANVISA.
No caso da prescrição de um antibiótico para ser tomado a cada oito horas, por cinco dias. Por que não tomar todas as doses num único dia? Porque a dose e o tempo de intervalo são parte da segurança e da eficácia no uso do remédio. Tomar tudo de uma vez aumenta riscos e reduz o efeito terapêutico. Seguir bula e receita não é formalidade: é Boa Prática.
Na agricultura o princípio é o mesmo. Boas Práticas Agrícolas (BPA) significam gerenciamento responsável, ético e sustentável, só que de defensivos agrícolas e produtos de base biotecnológica. Assim como todos nós cuidamos da própria saúde, o produtor cuida da saúde do solo e da lavoura.
O Brasil é um país tropical de dimensão continental, com biomas riquíssimos e, também, desafios fitossanitários diversos: plantas daninhas, insetos-praga e doenças capazes de se adaptar e se disseminar, inclusive pelas extensas fronteiras terrestres. Com isso, a rotina do produtor brasileiro inclui vários momentos antes, durante e após a safra de cada cultura.
Antes da safra, ele prepara a área - plantio convencional, direto, semidireto; manejo pré-plantio e controle de daninhas. Sementes certificadas são a base de uma cultura confiável.
Depois, com a lavoura implantada, o monitoramento constante é essencial para reparar anomalias. Plantas daninhas, que competem por água, luz e nutrientes, causam alelopatia/parasitismo, dificultam a colheita e reduzem a qualidade. Insetos/pragas provocam perdas econômicas ao se alimentarem das plantas ou transmitirem patógenos; doenças que comprometem vigor e produtividade.
Diante desses problemas, o produtor deve consultar o engenheiro agrônomo ou o técnico responsável por sua lavoura. Se necessário, o profissional visitará a propriedade e recomendará medidas — que podem incluir o uso de agroquímicos, sempre com receituário agronômico, respeitando bula e dose. A aquisição desses produtos deve ser feita em cooperativas, revendas ou distribuidoras. O atendimento reforça as condições de aplicação e cuidados de segurança na utilização dos produtos. Cabe ao agricultor seguir integralmente essas orientações e as do receituário e da bula, incluindo manuseio e uso de EPI – Equipamento de Proteção Individual.
Segundo a Embrapa, no documento Cuidados na aplicação de agroquímicos: https://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Pessego/PessegodeMesaRegiaoSerraGaucha/agrotoxi.htm, alguns cuidados são indispensáveis na aplicação de agroquímicos:
As Boas Práticas Agrícolas incluem o manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas e, nesse sentido, recomendam, por exemplo: a dessecação antecipada; o monitoramento de pragas e, quando necessário, a aplicação criteriosa de inseticidas; a aplicação de herbicidas, inseticidas e fungicidas nas doses e épocas recomendadas, seguindo fielmente a bula; o uso de sementes tratadas; e o uso de tecnologias de aplicação, que integra conhecimento sobre defensivos, formulações e adjuvantes, processo de pulverização, alvos e ambiente, para garantir aplicação correta e responsável. As recomendações completas podem ser vistas neste link: https://www.corteva.com.br/boas-praticas-agricolas.html.
À primeira vista, as Boas Práticas Agrícolas podem parecer complexas. Não são. Elas traduzem rotinas já presentes no dia a dia do produtor — do preparo ao monitoramento, da escolha do insumo à forma de aplicação. BPA é disciplina: entender, avaliar e praticar o que cada etapa exige, no início, no meio e no fim de cada safra. Ao adotar esses princípios, usamos corretamente os produtos, promovemos a sustentabilidade do agronegócio, aumentamos a produtividade, preservamos o meio ambiente e prolongamos a eficácia das tecnologias.
E, voltando ao meu sobrinho: “Mas é tudo veneno, tio!?!” Não. São defensivos agrícolas — muito necessários em um país tropical —, destinados a controlar pragas, doenças e plantas daninhas. Quando utilizados conforme a bula e à luz das Boas Práticas Agrícolas, ajudam o Brasil a permanecer entre os principais países agrícolas do mundo, plantando, cultivando e colhendo com responsabilidade e segurança.
Jair Francisco Maggioni é coordenador de Boas Práticas Agrícolas da Corteva Agriscience.
Fonte: In Press
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