Culturas Florestais

Ipês se adaptaram geneticamente à seca, aponta pesquisa da UFLA

Estudo avaliou a expressão dos genes de quatro espécies da árvore e mostrou que os ipês do cerrado possuem, inclusive, maior volume de raízes.


Publicado em: 03/12/2021 às 14:00hs

Ipês se adaptaram geneticamente à seca, aponta pesquisa da UFLA

Além de colorir o final do inverno e anunciar a chegada da primavera, o Ipê desperta olhares atentos não só de amantes de suas flores, consideradas símbolo nacional, como também de cientistas. Um estudo recente, publicado na revista britânica BMC Plant Biology, mostrou que a árvore da família Bignoniaceae adaptou-se geneticamente ao estresse hídrico, o que possivelmente possibilitou sua sobrevivência em diferentes regiões do País.

A pesquisa, liderada pelo professor de Genética e Melhoramento de Plantas Evandro Novaes, do Instituto de Ciências Naturais da Universidade Federal de Lavras (ICN/UFLA), teve início em 2013, quando ele era docente na Universidade Federal de Goiás (UFG). “Em resumo, nós estudamos a expressão dos genes de ipês de floresta e de cerrado quando desafiados pelo estresse hídrico, e observamos que os ipês de cerrado são muito menos responsivos, ou seja, possuem menos genes alterados pelo estresse hídrico, provavelmente porque possuem adaptações morfológicas como raízes maiores (maior desenvolvimento radicular)”, comenta o docente.

Os Ipês são árvores que gostam de calor e sol, porém mostraram-se geneticamente diferentes entre si, mesmo entre espécies que vivem em um mesmo habitat. “A hipótese inicial é que haveria diferença entre ipês de cerrado e de floresta, uma vez que o cerrado é um ambiente mais ensolarado, mais seco e suscetível ao fogo. Porém, nós verificamos que cada espécie responde diferentemente ao estresse e que não há um padrão comum, mesmo entre aqueles que compartilham um mesmo ambiente”. 

Para a pesquisa foram avaliadas 24 mudas de quatro espécies: duas de ipês de cerrado (Tabebuia aurea e Handroanthus ochraceus) e duas de ipês de mata (ipê-amarelo H. serratifolius e ipê-roxo H. impetiginosus). As sementes de três árvores adultas de cada espécie foram coletadas e plantadas em sacos plásticos, produzindo, dessa forma, várias mudas. Essas mudas cresceram normalmente por 10 meses, então a irrigação foi interrompida em metade do experimento (tratamento de seca). Quando o solo sob seca atingiu 40% da sua capacidade de retenção de umidade, as plantas dos dois tratamentos (irrigado e seca) foram colhidas e analisadas com relação a algumas características, como biomassa da parte aérea (caule, ramos e folhas) e das raízes.  Além disso, os pesquisadores analisaram a expressão de todos os genes das plantas, que é a grande novidade científica do estudo. “Extraímos os RNAs, que é como se fosse uma mensagem enviada pelos genes (que ficam contidos no DNA) para serem expressos e gerarem proteínas. Nós sequenciamos o RNA de cada planta colhida e essa contagem de sequências de RNA de cada gene é utilizada como uma medida da atividade (expressão) dos genes”, explica Evandro.

Essa minúscula partícula extraída, o ácido ribonucléico (RNA), é responsável pelo funcionamento da fisiologia das árvores, ou de qualquer outro organismo. A técnica de análise de expressão de genes utilizada na pesquisa é conhecida como RNA-Seq, e usa o sequenciamento para avaliar quanto o gene é ativado para a produção de sua proteína. “A base da técnica é relativamente simples: quanto mais sequências você obtém de um gene, significa que aquele gene está sendo mais expresso (mais ativado) e, portanto, está sendo mais utilizado naquela condição. Com isso, nós identificamos, em cada espécie, quais genes estavam sendo mais ou menos ativados (expressos) em resposta à seca. A ideia era verificar se os ipês de cerrado respondem diferentemente dos de floresta ao estresse hídrico”.

O estudo mostrou que as espécies de cerrado são, em geral, menos responsivas, ou seja,  alteram menos a expressão dos genes quando comparadas com as de mata. “Nossa hipótese é que isso se deve às adaptações que as espécies do cerrado já possuem, como a maior biomassa de raízes do que as de mata. Devido a essas adaptações morfológicas, as plantas de cerrado precisaram de menores alterações na sua fisiologia quando foram desafiadas com o estresse hídrico”.

Conforme o pesquisador, os resultados podem guiar o melhoramento até mesmo de espécies cultivadas, que podem ser selecionadas buscando-se adaptações, como, por exemplo, maior volume de raízes, que as tornem mais tolerantes à seca.

A pesquisa “RNA-Seq revela diferentes respostas à seca em árvores neotropicais de savanas e florestas sazonalmente secas” foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e está disponível, com acesso livre, no site da Biomedcentral. https://rdcu.be/czTr5

Fonte: Comunicação UFLA

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