Outros

As críticas do setor de biocombustíveis à proposta de revisão do RenovaBio

Estipular um preço-teto para os créditos de carbono do Renovabio seria, na visão de produtores de biocombustíveis e analistas ouvidos pela epbr, uma interferência injustificada no mercado de CBIOs, que demandaria, no entendimento de algumas dessas fontes, de alteração na lei de criação do programa


Publicado em: 15/12/2020 às 09:00hs

As críticas do setor de biocombustíveis à proposta de revisão do RenovaBio

Proposta foi apresentada pela Brasilcom e foi tema da Diálogos da Transição na semana passada, que trouxe a visão do setor de distribuição -- são várias, não apenas o controle de preços.

"Achamos essa proposta equivocada juridicamente, inoportuna do ponto de vista ambiental e absolutamente contraditória com aquilo que o mundo busca no sentido da sustentabilidade", argumenta o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP).

Presidente da Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético, o parlamentar acredita que a fixação de preços é um "tiro no pé", além de precisar passar pelo Congresso Nacional.

A medida é defendida pelas distribuidoras como uma forma de evitar que um desequilíbrio do mercado de créditos leve a disparada de preços dos CBIO.

"Vimos o CBIO ser negociado a um preço muito equilibrado, não houve nada que colocasse em risco todo o conceito do crédito". afirma Jardim.

Após atingir o preço máximo de R$ 72 em 4 de novembro, os CBIOs são negociados em um patamar próximo de R$ 40 -- entre R$ 38 e R$ 43 -- nos primeiros dias de dezembro.

Outra iniciativa da Brasilcom foram as ações na Justiça para reduzir a meta de 2020 a 25%. No sábado, Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um pedido de liminar, na sequência de outra decisão da Justiça Federal (em outro mandado de segurança), também desfavorável ao pedido da associação.

Dos 16,7 milhões de créditos de descarbonização (CBios) emitidos pelos produtores de biocombustíveis, 10,3 milhões estão em poder de distribuidoras, segundo dados da B3, divulgados pela Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), na segunda (8).

"A expectativa é que até o final de 2020, as distribuidoras cumpram suas metas e que o número de CBios emitidos e comercializados supere os 18 milhões", comenta Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da Unica, em nota.

Preço-teto foi estudado pelo governo. Em maio, segundo o Estadão, o Ministério de Minas e Energia (MME) chegou a fazer uma consulta jurídica interna sobre a possibilidade de teto para o título.

"Do ponto de vista jurídico, não é possível a fixação de preço teto para o CBIO, sem que haja larga e profunda justificativa técnica e econômica, motivada por circunstâncias de desequilíbrio de mercado e construída por meio de intervenção adequada do Estado na Economia, inclusive com a realização de estudos e análises de impacto regulatório", conclui o parecer.

Para os produtores de biodiesel, a proposta de um preço-teto, além de intervencionista, pode levar o preço do CBIO a um valor tão baixo que desestimule a participação das indústrias no programa.

Donizete Tokarski, diretor da Ubrabio, argumenta que quem estabelece o preço é o mercado e o engessamento do preço teria o efeito de "não dar vazão à necessidade que a sociedade tem de cada vez mais reduzir as emissões".

Já Julio Minelli, diretor da Aprobio, explica que valores muito baixos para o CBIO podem não cobrir os custos de certificação, emissão e impostos, e comprometer a certificação de novos produtores, ou a manutenção das certificações existentes.

"Certamente haverá uma tendência natural dos emissores em não aceitar comercializar os certificados por valores que não cubram os custos de certificação", avalia Minelli.

Eles também criticam a possibilidade de refinarias e distribuidoras poderem emitir CBIOs; metas para emissores; e o que o estudo da Brasilcom, elaborado pela PUC-Rio, coloca como "transparência nas negociações" -- veja a entrevista com o professor Márcio Thomé, um dos responsáveis pela pesquisa.

"O que eles [distribuidores] falam é que não têm uma previsão do consumo de combustível. Ora, se eles não têm previsão do consumo de combustível e o CBIO está atrelado à produção dos biocombustíveis, como a gente vai estabelecer metas para emissão de CBIO? O produtor, para emitir CBio, tem que produzir o biocombustível primeiro", questiona Tokarski.

Outra preocupação é com a criação de uma taxa de custódia sugerida pela Brasilcom. Julio Minelli avalia que um preço mínimo para aceitar comercializar estes certificados aumentaria o custo do programa.

"Pensar em uma taxa de custódia, principalmente para o emissor primário, somente aumentará os custos para o emissor e, assim, aumentará o preço mínimo que estes emissores estariam dispostos a vender os seus certificados emitidos", destaca o diretor da Aprobio.

Quanto à transparência, a preocupação da Ubrabio é que a divulgação de onde vem o CBIO poderia culminar em uma "venda casada", com distribuidoras negociando com as usinas o preço do combustível em função do custo do crédito de descarbonização.

Já a Aprobio acredita que o interesse esteja também associado a um receio de que ocorra algum tipo de especulação com os certificados e lembra que existem mecanismos na lei que podem ser regulamentados para neutralizar ou mitigar a intenção para uso especulativo.