Internacional

Produtores de algodão vão à OMC contra norte-americanos

Os produtores brasileiros de algodão articulam uma estratégia junto ao mercado global, para recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as modificações na lei agrícola dos Estados Unidos, a Farm Bill


Publicado em: 24/02/2014 às 11:30hs

Produtores de algodão vão à OMC contra norte-americanos

"Os mais prejudicados com essa legislação são os africanos e os australianos. Nós pensamos em convidar as pessoas desses países, para, dentro de um prazo máximo de três meses, fazer coro em um painel junto ao Brasil", revelou ao DCI o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Gilson Pinesso.

A entidade, que representa os produtores do segmento de algodão brasileiro, estima que a perda para o mercado doméstico chegue a R$ 350 milhões por ano.

"O que os produtores esperavam que o Brasil anunciasse uma retaliação contra os Estados Unidos, o que e era factível de se aplicar por conta do não pagamento dos americanos com o que foi acordado, através do memorando de entendimento. Essa ’nova’ Farm Bill, na forma que foi proposta, continua com várias distorções, que podem alcançar 13% do mercado", afirma.

As mudanças na lei, que garantem agora até 90% das receitas da safra - independentemente do clima - aos produtores norte-americanos foi sancionada no último dia 7 pelo presidente dos EUA, Barack Obama.

Após a medida, representantes dos produtores brasileiros de algodão foram a Washington para debater o tema junto aos congressistas do país.

Para acalmar os ânimos, o Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex), autorizou, na última quarta-feira (19), a abertura de um painel para avaliar a nova legislação. "Análise preliminar realizada pelo governo brasileiro indica que persistem elementos que distorcem o comércio internacional do algodão na nova lei norte-americana", diz a Câmara do Comércio Exterior (Camex), em nota oficial por seu site.

Pela nova regra, os agricultores norte-americanos devem receber R$ 956 bilhões pelos próximos cinco anos, diferentemente da antiga legislação, em que a quantia chegava a R$ 45 bilhões por ano.

Outro ponto que impacta na competitividade internacional, é o GSM-102, programa de sustentação de preços, que financia exportações aos produtores dos EUA por juros baixos e prazos de pagamentos longos.

Uma primeira avaliação é que o impacto econômico da nova lei para a agricultura brasileira é neutro a curto prazo. Isso porque a situação atual de preços deve persistir até pelo menos o final de 2015, prazo em que várias políticas de apoio aos produtores, mantidas no novo texto, não deverão ser acionadas, explica em nota, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA).

"A derrota dos Estados Unidos no contencioso internacional foi emblemática, mudando o rumo dos programas de subvenção não só para o algodão, mas também para outros produtos", explica a presidente da entidade, Kátia Abreu.

Para Pinesso, garantir as receitas aos produtores dos EUA pode criar um excesso de oferta, prejudicando o setor no futuro. "Se há uma apólice que garante a receita, vai haver plantações mesmo nas condições em que o solo não é próprio. Em anos bons, quando o clima for adequado, o produtor nos Estados Unidos vai oferecer uma grande quantidade de algodão. Isso com certeza vai trazer uma distorção de preços ao mercado, observa.

Em 2009, o Brasil obteve vitória emblemática contra os Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio (OMC) por disparidades semelhantes às atuais.

Na época, os americanos foram condenados a pagar US$ 830 milhões por infringirem regras do mercado global. A medida só não entrou em vigor por conta de um acordo entre os dois países, em que o governo dos EUA pagaria US$ 147 bilhões por ano ao Instituto Brasileiro do Algodão (IBA).

Diálogo

Representantes do governo brasileiro iniciam, nesta semana, negociações com os norte-americanos para tentar evitar a adoção de uma nova retaliação por conta dos subsídios do algodão. As perspectivas, no entanto, são pouco otimistas. A avaliação dos técnicos brasileiros é que a nova lei agrícola americana é ainda pior que a anterior e, mais do que isso, não há previsão para mudanças relevantes e que atendam os produtores brasileiros.

"O que o governo brasileiro e a Abrapa estão dizendo é que os americanos alteraram alguns programas que eram distorcivos, mas outros pontos criados também apresentam disparidades", analisa o ex-secretário do Comércio Exterior e consultor da Abrapa, Welber Barral.

Membro do governo na época em que o Brasil obteve a primeira vitória, Barral alerta que, apesar de hoje o Diretor-Geral da OMC ser brasileiro, as decisões da entidade dizem respeito ao comércio mundial, e não uma rivalidade entre os dois países. "É uma questão técnica e não política. E, apesar de ser um brasileiro e importante mediador, o diretor da OMC representa a entidade e não influencia nesse caso", opina.