Publicado em: 18/08/2014 às 19:40hs
Segundo economistas, o ambiente já adverso em função da piora das expectativas para o crescimento foi exacerbado em junho, quando a Copa do Mundo levou a uma forte paralisação da atividade.
Analistas consultados pelo Valor afirmam que a conjunção de fatores negativos provocou retração significativa do consumo interno de bens de capital desde abril, sinal de que a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e construção civil) encolheu pela quarta vez seguida na comparação trimestral.
Após ter recuado 2,1% entre janeiro e março, as estimativas apontam queda de 3% até 5% para o investimento de abril a junho frente aos três meses anteriores, feitos os ajustes sazonais. Passados os efeitos atípicos da Copa, a expectativa é que julho possa trazer algum alento para estes dados, mas a possibilidade de recuperação um pouco maior só é aguardada para o fim do ano, quando a definição do resultado dos eleições pode desanuviar as incertezas.
Rodrigo Baggi, da Tendências, calcula que o consumo aparente de bens de capital diminuiu 8,1% entre o primeiro e o segundo trimestres, influenciado principalmente pela retração de 9,1% da produção nacional do setor, descontando as influências sazonais. Segundo a série da consultoria, o recuo na demanda interna desses itens - que soma a fabricação doméstica e a importação de bens de capital e desconta as exportações - foi o maior desde o início de 2012. Nos primeiros três meses daquele ano, o investimento caiu 2,2%.
Naquele período, lembra Baggi, a economia desacelerou com força, o que já levaria a demanda por bens de capital a enfraquecer, ao mesmo tempo em que houve interrupção na produção de veículos pesados devido às novas normas para motores. No primeiro e no segundo trimestres deste ano, ele avalia que a conjuntura foi parecida com a de 2012.
Após solucionado o imbróglio do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do BNDES, que demorou a divulgar as novas regras de financiamento para máquinas e equipamentos em 2014, a crise na Argentina - um importante destino para os produtos manufaturados brasileiros, inclusive bens de capital - se intensificou. Depois disso, foi a vez de o aumento das discussões sobre os riscos de um racionamento de energia elétrica afetar a confiança do empresariado.
Fechando essa equação, a Copa provocou uma freada mais brusca que o previsto da atividade em junho e foi decisiva para um comportamento mais fraco dos investimentos no segundo trimestre, afirma o economista. "A paralisia de um mês e meio da atividade foi subestimada. Por mais que o setor de eletroeletrônicos ou de alimentos e bebidas tenha sido estimulado, o saldo foi extremamente negativo", diz Baggi, que trabalha com queda de 3,6% da FBCF no trimestre.
Para o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, a paralisia da atividade prejudicou os investimentos especificamente em junho, mas não em todo o segundo trimestre, já que o impacto da Copa foi visto pelos empresários como temporário. Por outro lado, diz Borges, o alto nível de incertezas em relação a 2015, o aumento da ociosidade na capacidade produtiva da indústria e a avaliação do empresariado de que ainda é possível haver um racionamento de energia diminuíram a confiança, que tem importante correlação com a formação de capital físico.
Se a estimativa da LCA de retração de 5% da FBCF entre o primeiro e o segundo trimestre for confirmada, o investimento terá encerrado o primeiro semestre em nível 7% abaixo do observado de janeiro a junho do ano passado. Até o fim de 2014, a consultoria espera que esse tombo diminua para 5,9%. Segundo Borges, uma melhora só deve acontecer depois do desfecho das eleições presidenciais. "Existe muita polarização em torno dos candidatos e o cenário para 2015 não depende só de quem ganhar, mas o fato é que essa discussão gerou uma parada geral nas decisões de investimento", disse.
Sócio e economista-chefe da JGP Gestão de Recursos, Fernando Rocha acredita que não há uma relação direta entre ciclos eleitorais e aumento de incertezas, porque 2006 e 2010 foram anos de alta dos investimentos. Já no pleito atual, há um nível maior de críticas sobre a política econômica, comenta Rocha, e por isso as eleições podem ter afetado mais o ânimo dos empresários. Para ele, porém, esta não é a principal explicação para o recuo de 3,3% previsto para a formação bruta na passagem trimestral. Na mesma comparação, Rocha calcula que a absorção interna de bens de capital ficou 9,4% menor.
Em sua opinião, há uma devolução mais forte que o esperado da expansão de 5,2% da FBCF no ano passado. A trajetória da formação bruta em 2013 e 2014 precisa ser analisada em conjunto, diz, porque compras de máquinas que poderiam ocorrer neste ano foram antecipadas. "O investimento foi inflado artificialmente em 2013. O PSI deu crédito muito barato para a compra de bens de capital". Mesmo assim, Rocha observa que o avanço da FBCF no ano anterior pode ser creditado à aquisição de bens de capital mais "leves", como caminhões e maquinário agrícola, enquanto o desempenho dos setores de construção civil e da indústria não foi tão expressivo.
Para André Muller, da Quest Investimentos, não há fatores novos por trás do comportamento pífio da formação de capital físico, que, em seus cálculos, caiu 3% de abril a junho. "Houve um forte acúmulo de estoques de bens de capital desde o fim de 2013, resultado da fraca disposição de investir na expansão da capacidade produtiva diante do cenário de crescimento econômico baixo", diz. A expectativa de Muller é que o investimento fique relativamente estável ao longo do segundo semestre, dado que os inventários na indústria de bens de capital seguem em nível excessivo.
Fonte: Canal do Produtor
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