Publicado em: 13/02/2014 às 20:20hs
Levantamento da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) com os 14 países mais importantes como destino de produtos brasileiros mostra que em 9 deles houve elevação de concentração em pelo menos um dos itens mais embarcados pelo Brasil ao país.
A turbulência econômica na Argentina, por exemplo, deve afetar as exportações brasileiras, principalmente de manufaturados. De todos os veículos que o Brasil exportou em 2013, 87,5% foram para o país vizinho. Em autopeças, foram 55,9%. Em veículos de carga, 58,3%. Em tratores, 47,6%. No ano passado, na verdade, o Brasil aumentou a dependência em relação aos argentinos como compradores desses itens. Em 2012, os argentinos compraram 82,7% de todo os automóveis que o Brasil exportou. Para autopeças, veículos de carga e tratores, foram 53,5%, 50,2% e 35,8%, respectivamente.
A Argentina, porém, não é um fenômeno isolado. No ano passado os chineses ficaram com 75,2% de toda a soja brasileira vendida ao exterior. Em 2012, essa fatia era de 68,9%. A China também foi o destino de 30,4% de toda a celulose exportada pelo Brasil. No ano anterior foram 26,3%. Para os Estados Unidos, foram embarcados 69,8% de todos os semimanufaturados de ferro e aço exportados pelo Brasil, contra 50,6% do ano anterior. A fatia dos americanos nas vendas de etanol caiu de 68,6% em 2012 para 58,6% no ano passado, mas continuou elevada. Para o Japão, o Brasil vendeu 51,7% de todo o alumínio exportado. Clientes tradicionais nesse item, os japoneses compraram no ano anterior 44,1% do alumínio brasileiro vendido ao exterior. Para os alemães o aumento aconteceu para o minério de cobre. A participação da Alemanha na exportação brasileira desse minério subiu de 22,8% para 34,7% de 2012 para o ano passado.
Os exemplos não param por aí. A Coreia do Sul elevou sua participação no algodão brasileiro de 14,1% em 2012 para 22,8% no ano passado. O Chile continua um grande comprador de chassis: foram 27,3% em 2012 e 27,5% no ano passado. Para os russos a concentração aconteceu em carne suína: de 27,2% em 2012 para 33,5% no ano passado. Para a Arábia Saudita, a concentração aconteceu no principal item da pauta de exportação brasileira para o país: a carne de frango, cuja fatia aumentou de 17,7% para 20%.
O quadro, diz José Augusto de Castro, presidente da AEB, mostra que a alta concentração não aparece apenas quando se olha a pauta exportadora de forma agregada, mas também quando se verifica o desempenho levando em conta os principais destinos. "Isso torna o exportador brasileiro não só dependente de poucos produtos, mas também de poucos compradores." A especialização em alguns produtos não é um problema em si, lembra ele, mas a concentração em níveis altos revela a dificuldade de inovar e diversificar a pauta.
O perfil dos produtos que são alvo de concentração também chama a atenção. "Com exceção da Argentina - para onde o embarque de automóveis, partes e peças e outros itens de transporte é relevante - e talvez o Chile, para onde vendemos chassis, todo o resto dos itens mais importantes para cada país são commodities." A natureza da pauta torna a exportação brasileira mais sujeita ainda a mudanças bruscas de mercado. "Em commodities o Brasil é um tomador de preços. Por isso o desempenho da exportação tende a oscilar conforme os preços determinados internacionalmente."
A prevalência das commodities fica mais evidente quando se olha a representatividade dos principais itens de exportação no total que o Brasil embarca para um determinado destino. O exemplo mais visível é a China, em que a soja representa 37,3% de tudo o que o país asiático comprou do Brasil em 2013 enquanto o minério de ferro responde por uma fatia de 34,8%.
Castro chama a atenção, porém, que o alto grau de dependência fica também evidente quando se olha destinos para os quais, à primeira vista, não há concentração. Ele exemplifica com Índia, França e Espanha. Para os indianos o Brasil vendeu 12,2% de todo o petróleo exportado no ano passado. Esse quinhão representou, porém, 50,7% de tudo o que os indianos compraram do Brasil em 2013. A soja vendida aos espanhóis respondeu por 4,6% do grão brasileiro embarcado, mas representou 29,6% de tudo o que o Brasil exportou para a Espanha em 2013. Para os franceses, foi o minério de ferro, com fatia de 30,7% de tudo o que o Brasil embarcou para a França no ano passado, embora tenha representado apenas 3,2% de todo o minério brasileiro comercializado no mercado internacional.
Lia Valls, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV) e professora da Uerj, tem opinião semelhante. "A concentração de exportação é uma tendência do comércio internacional. Alguns países asiáticos têm exportação muito concentrada, mas porque se especializaram e, por isso, exportam manufaturas de maior valor agregado, como bens de alta tecnologia." Esse, porém, não é o caso do Brasil, ressalva.
O caminho para reverter a concentração da pauta, diz Lia, seria reforçar a fatia dos manufaturados. Dados da Organização Mundial do Comércio (OMC), diz ela, mostram que o ganho de mercado da exportação brasileira não aconteceu pela via dos manufaturados. Segundo os dados, destaca, a fatia brasileira nas exportações mundiais aumentou de 0,9% em 2000 para 1,3% em 2012. A participação dos embarques de manufaturados, porém, não cresceu, com fatia igual de 0,7% nesse período de 12 anos. Apenas de 2004 a 2008 a participação dos manufaturados brasileiros chegou a alcançar 0,8% das exportações mundiais.
O crescimento da exportação brasileira principalmente em produtos mais básicos, diz Lia, contribuiu para a pouca diversificação da pauta. O índice de concentração das exportações por países calculado pelo Ibre, destaca a professora, revela que a partir de 2000 os mercados brasileiros começaram a se diversificar, tendência que se manteve até 2008, quando voltaram a ficar mais concentrados a cada ano. O índice por produtos, também do Ibre, mostra tendência de desconcentração até 2006. A partir desse ano, porém, o índice passou a apresentar alta e chegou a 0,031 em 2013. Em 2000 era de 0,011.
Silvio Campos Neto, economista da Tendências, diz que a concentração reflete um processo de perda de competitividade e uma política comercial que priorizou as relações com os países do Mercosul, sem buscar alternativas de acordos regionais e comerciais. "Os acordos são instrumentos importantes para integrar cadeias e agregar valor, principalmente quando se fala de bens manufaturados."
Fonte: Canal do Produtor
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