Publicado em: 17/11/2025 às 10:20hs
O aumento das exigências internacionais para que produtores brasileiros comprovem, de forma contínua, a ausência de dano ambiental como pré-condição para exportar commodities — especialmente soja — reacendeu um debate jurídico relevante no país. Para a advogada Márcia de Alcântara, especialista em Direito Agrário e integrante do escritório Celso Cândido de Souza Advogados, parte dessas cobranças extrapola o campo da sustentabilidade e pode entrar em conflito com princípios constitucionais e econômicos.
Segundo Márcia, quando grandes tradings globais se organizam em associações e firmam pactos com auditorias próprias, acabam impondo exigências ambientais mais rígidas do que aquelas previstas em lei.
Ela alerta que esses mecanismos transferem ao produtor o ônus de provar constantemente sua regularidade ambiental — mesmo quando já cumpre o Código Florestal e demais normas nacionais.
“Esses acordos invertem a presunção de legalidade e de boa-fé, criando um sistema em que o produtor precisa se justificar continuamente”, afirma.
Para a especialista, quando tais exigências se tornam condicionantes para o acesso ao mercado, há tensionamento de princípios como segurança jurídica e devido processo legal.
Um dos principais exemplos citados pela advogada é a Moratória da Soja, pacto que impede a compra do grão cultivado em áreas desmatadas após 2008 na Amazônia.
Márcia afirma que esse modelo funciona como uma espécie de “regulação privada”, com possíveis reflexos concorrenciais.
Entre os pontos críticos apontados por ela estão:
Essas práticas, segundo a advogada, podem se enquadrar como condutas anticoncorrenciais à luz do artigo 36 da Lei 12.529/2011.
Ela destaca ainda que cobranças financeiras e bloqueios comerciais a produtores que não apresentem documentos adicionais equivalem a “sanções privadas sem respaldo legal”.
A discussão ganhou novos contornos nos últimos meses.
Uma decisão liminar do ministro Flávio Dino, no Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu temporariamente processos judiciais e administrativos relacionados à Moratória da Soja, para evitar decisões contraditórias até o julgamento definitivo.
Enquanto isso, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) decidiu aguardar o posicionamento do STF antes de avançar nas investigações, embora mantenha atenção sobre possíveis trocas de informações sensíveis entre empresas do setor.
Entidades do agronegócio, como CNA e Aprosoja-MT, defendem que o Estado siga atuando na esfera concorrencial. Para elas, a suspensão total das investigações pode comprometer a tutela da concorrência e permitir práticas coordenadas de compra.
Entre os pontos mais criticados pelo setor produtivo estão:
“Esses arranjos acabam criando regras opacas, sem devido processo, e potencialmente substituem a regulação pública”, reforça Márcia.
Para a especialista, dois caminhos principais podem surgir a partir do julgamento no STF:
1. Decisão favorável aos produtores
Brasil já possui legislação ambiental robusta, destaca a advogada
Márcia lembra que o Brasil dispõe de um dos arcabouços legais ambientais mais completos do mundo. Entre os instrumentos já consolidados estão:
Para ela, qualquer exigência externa deve respeitar proporcionalidade, transparência e o devido processo legal.
“Sem isso, esses mecanismos podem ferir a legislação brasileira e distorcer a concorrência”, conclui.
Fonte: Portal do Agronegócio
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