Processamento

Técnicas de pré-mistura, pré-salga e pré-cura para o processamento de carnes

Pré-mistura, pré-salga e pré-cura são técnicas que vêm sendo utilizadas há várias décadas na indústria cárnea


Publicado em: 16/09/2015 às 00:00hs

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Pré-mistura, pré-salga e pré-cura são técnicas que vêm sendo utilizadas há várias décadas na indústria cárnea. Essas tecnologias, em determinadas aplicações, podem melhorar significativamente o processamento e o desempenho produtivo se compreendidas e aplicadas corretamente. Sua capacidade de auxílio no gerenciamento de proteínas, gorduras e componentes umidificadores em um sistema cárneo pode melhorar fatores como ligação proteica, textura, rendimento cárneo e até mesmo coloração, apenas para citar alguns atributos.

Definições

Pré-mistura e pré-salga são termos utilizados intercaladamente, porém com significados parecidos. Ambos podem ser empregados para descrever a adição de sal, de agentes de cura, de fosfatos e de água em uma mistura cárnea, seguida de um tempo de espera mais prolongado, que varia de 1 a 14 dias, enfatizando-se o impacto referente ao uso do sal na carne. A pré-salga também pode ser descrita como um processo mais focado de adição de sal (e, às vezes, de agentes de cura) a uma mistura cárnea, incluindo um tempo de espera maior.

Pré-cura normalmente se refere à adição de sal, de agentes de cura e, às vezes, de temperos em pedaços de carne que variam, em tamanho, entre 5,08 cm e 0,31 cm. Um tempo de espera maior é crucial nesse tipo de técnica; entretanto, a principal ênfase recai no impacto que a cura causa na carne. Além disso, a pré-cura geralmente é resultado de um processo de pré-mistura, porém esse não é seu principal objetivo.

Pré-mistura

O principal objetivo da pré-mistura é melhorar a funcionalidade dos ingredientes cárneos, resultando em benefícios tangíveis no produto final.

Estes resultados/benefícios são típicos do processo de pré-mistura:

1) Aperfeiçoamento da solubilização proteica: durante o processo de pré-mistura, as matérias-primas são submetidas a uma redução de partículas (cerca de 0,5 a 1 polegada), misturadas com sal, agentes de cura, fosfatos e uma parte de água (para facilitar a mistura). A ação da mistura, na presença do sal, inicia a solubilização e extração de proteínas miofibrilares. Contudo, a extração proteica pode ser considerada auto-limitadora no decorrer da mistura, uma vez que o excesso desse processo pode gerar superextração, danos físicos à proteína e extração desigual, causando impactos nas etapas posteriores de processamento e nos atributos qualitativos do produto final. Consequentemente, a pré-mistura é uma ferramenta eficaz e não destrutiva que serve para minimizar os danos físicos às proteínas, ao mesmo tempo em que melhora sua funcionalidade. Por meio de um tempo de espera de refrigeração, o sal continuará a solubilizar as proteínas, restituindo sua funcionalidade elevada, impactando sua ligação, capacidade de retenção de água, estabilização da matriz gelatinosa e textura do produto final. Tempos de espera menores que 12 horas, ou mais longos que 5 ou 6 dias podem causar impactos expressivos na funcionalidade proteica. Ademais, no decorrer de um tempo de espera, fosfatos de sódio ou de potássio podem se tornar mais funcionais, visto que são hidrolisados na forma de pirofosfato, o que pode ajudar na dissociação da actina e da miosina. Essa dissociação é fundamental para contribuir com a melhoria da funcionalidade proteica. Quanto maior for a dissociação da actina e da miosina, maior será sua funcionalidade. Todavia, é importante observar que caso se disponibilize mais tempo para que a forma de pirofosfato se hidrolise em ortofosfato, quase todas as funções proteicas serão perdidas, causando resultados indesejáveis, tais como elevadas perdas de cozimento, textura pobre e altos índices de purga;

2) Aperfeiçoamento da capacidade de corte do tecido adiposo: a técnica de pré-mistura demonstrou ter melhorado a funcionalidade do tecido adiposo (gordura), contudo o modo preciso de ação ainda não pode ser totalmente compreendido. Há relatos de que a pré-salga do tecido adiposo pode aperfeiçoar a capacidade de corte por meio da manutenção da integridade da partícula após operações de moagem, mistura ou corte. Algumas pesquisas recentes feitas pela indústria cárnea sugerem que a técnica de pré-salga pode aprimorar a estrutura celular do tecido adiposo ou propiciar as habilidades, às proteínas mais funcionais, de circundar e ligar, de modo mais otimizado, a gordura no interior da matriz proteica, gerando um efeito mais protetor e estabilizante. O resultado disso é a redução na destruição de tecidos magro e adiposo durante a moagem, a mistura ou outros processos de fabricação. As experiências anteriores da indústria cárnea sugerem que salgar o tecido adiposo é tão importante quando salgar o tecido magro, com o objetivo de aplicar isso em uma infinidade de operações de fabricação de linguiças;

3) Flexibilidade de processamento: devido ao fato de o processo de pré-mistura demandar a inclusão de um tempo de espera, é possível a existência de um cronograma de produção flexível. As “janelas” dos períodos de processamento podem ser melhoradas e os intervalos de tempo de espera nos finais de semana e feriados podem ser mais bem gerenciados.

Pré-cura

O principal objetivo da pré-cura é maximizar a utilização de agentes de cura; a saber: nitrito de sódio. Desde a ampla utilização de catalizadores de cura empregados para facilitar o processo de conservação, os procedimentos de pré-cura têm se tornado cada vez menos necessários. Antes da adoção de ingredientes como o eritorbato e ascorbato de sódio, houve uma necessidade prática de possibilitar a diminuição vagarosa (conversão) de nitrito em óxido nítrico a fim de originar pigmentos cárneos de cura. Hoje em dia, a pré-cura ainda é utilizada de forma limitada, e alguns benefícios, embora normalmente ainda pequenos, ainda estão presentes, visto que se pode observar um emprego ligeiramente melhor do nitrito após o processo de pré-cura. Os benefícios podem incluir uma coloração de cura mais refinada na carne e vida útil da coloração de cura mais prolongada. Mesmo assim, a compreensão e emprego mais aprofundados do processo de cura, nos dias de hoje, especialmente marcados pelo uso de catalisadores de cura, eliminaram quase que totalmente qualquer benefício palpável da pré-cura antes considerado indispensável… o que é algo bom.

Talvez o papel que ainda cabe ao processo de pré-cura está na fabricação de produtos cárneos inigualáveis que recebem adição de carne. Por exemplo, a técnica de pré-cura (ou adição de sal, nitrito de sódio e temperos) de um pedaço proveniente de uma peça de carne ao longo de vários dias, estendendo-se até mesmo por mais de uma semana, seguida da adição do bloco de mistura cárnea (com um tamanho de partícula diferente), pode resultar em um produto inigualável, com uma aparência de que foi curado diversas vezes.

Resumindo

Pré-mistura e pré-cura são técnicas que deveriam ser amplamente levadas em conta no sentido de refinar os atributos qualitativos do produto de um ponto de vista do desempenho do alimento cárneo ou de sua atratividade. Na indústria cárnea moderna, na qual velocidade, eficiência e custos geralmente orientam as decisões referentes à produção, as técnicas aqui debatidas oferecem perspectivas sobre o conceito de que a diminuição do ritmo de um processo pode, na verdade, acelerar a produção, focando-se a funcionalidade, e ao mesmo tempo melhorando a performance do produto e sua qualidade.

Por Jeff J. Sindelar

Fonte: CarneTec

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