Brasil

Os dekassegui e a crise econômica japonesa

Desde o final de 2008, os problemas econômicos globais refletem-se no Japão, onde a desaceleração do nível de atividade foi rápida


Publicado em: 17/03/2009 às 16:00hs

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Desde o final de 2008, os problemas econômicos globais refletem-se no Japão, onde a desaceleração do nível de atividade foi rápida. Uma das primeiras repercussões foi a demissão de dekassegui. Neste momento, há muitas perguntas sobre o futuro desses trabalhadores. Boa parte das repostas depende do desempenho da economia nipônica. Por isso, apresentamos levantamento dos seus indicadores atuais. Nos últimos anos, seus resultados estiveram muito atrelados ao comércio exterior. Contudo, já no inicio de 2008 havia projeções de um ritmo global menor. O que não se considerava era a quebra do Lehman Brothers e o consequente colapso do sistema financeiro.

No primeiro momento, o setor financeiro japonês não foi tão abalado como o dos EUA e Europa, pois suas instituições não tinham grande volume de ativos relacionado às hipotecas subprime. No entanto, desde o segundo semestre de 2008 o iene passou por um período de valorização, que pode ser explicado pelo “carry trade” - operação financeira de compra de ienes moeda forte com taxa de juros muito baixa, para aplicação ou pagamentos onde a taxa de juros é mais elevada. Comparando-se os valores de câmbio apresentados pelo Banco do Japão para o período de agosto/08 a janeiro/09, a valorização do iene foi de 17,7% frente ao dólar, passando de 104,76 ienes/dólar, para 89,51 ienes/dólar.

Com a valorização do iene, os produtos japoneses ficaram mais caros em dólares no mercado internacional. Assim, as exportações, já afetadas pela desaceleração da economia mundial, sofreram forte queda. Como conseqüência, as exportações declinaram 11,85% no terceiro trimestre de 2008, segundo a Japan External Trade Organization (Jetro). O resultado de janeiro foi ainda pior, com retração de 34,1%. Em janeiro, um dos maiores recuos referiu-se às vendas ao mercado norte-americano (menos 42,8%). Esse número é importante, pois os Estados Unidos representam 16,4% do total das exportações japonesas.

Paralelamente aos problemas no comércio exterior, que fizeram com que o resultado da balança comercial saísse de um superávit de US$ 775,3 milhões para um déficit de US$ 3,25 bilhões, houve a retração do mercado doméstico. Segundo o Ministério de Assuntos Internos e Comunicação, desde o primeiro trimestre de 2008 os indicadores vêm mostrando tendência de redução do consumo. Vê-se, portanto, uma dupla contração da demanda. O resultado desse cenário foi a involução do PIB em 12,7% no último trimestre de 2008, em relação ao mesmo período de 2007. Em 2009, as noticias de dificuldades persistem. Por exemplo: anunciou-se que, em fevereiro, houve 1.318 falências, um recorde em um só mês nos últimos seis anos.

Diante de todo esse cenário, ocorreram demissões de muitos dekassegui, cujo trabalho já vinha sendo ameaçado há algum tempo, em razão da concorrência com trabalhadores asiáticos, cujos salários são menores. E, no curto prazo, a empregabilidade dos brasileiros no Japão não deverá melhorar, pois a recuperação da economia não deverá ser rápida nesse país. Havia expectativas de que, no segundo semestre de 2009, a economia mundial começaria a dar sinais de recuperação. No entanto, o clima pessimista persiste.

A melhora da economia internacional seria importante para resgatar a empregabilidade dos dekassegui, pois os consumidores nipônicos estão muito tímidos. Ou seja, provavelmente será a demanda externa que reconduzirá o país ao crescimento. Domesticamente, as ações do governo, assim como em outras nações, não têm conseguido reaquecer o nível de atividade. Em março, a Câmara dos Representantes (Baixa) aprovou a distribuição de dinheiro público para a população aumentar o consumo. A medida ainda precisa passar pela Câmara dos Conselheiros (Alta). Porém, mesmo aprovada, sua eficiência é contestável, como indicam os seguintes fatores: a cultura poupadora do japonês; o envelhecimento da sociedade, mais um estímulo à poupança para maior segurança na terceira idade; perspectiva de deflação, fazendo com que se postergue o consumo. A situação dos trabalhadores brasileiros no Japão, portanto, não é fácil. Podem ocorrer mais demissões e há pouca esperança de reabertura de vagas em curto prazo.

Alexandre Ratsuo Uehara - Professor de Relações Internacionais da Faculdade Rio Branco (FRB), vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos Japoneses (ABEJ), pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais (USP) e membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (USP).

Fonte: Ricardo Viveiros & Associados - Oficina de Comunicação

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