Publicado em: 16/04/2025 às 20:00hs
Cenário global de incertezas e riscos para o agronegócio
A recente decisão dos Estados Unidos de aplicar tarifas recíprocas a seus parceiros comerciais reacendeu incertezas no cenário econômico global. Anunciadas no início de março e efetivadas no início de abril de 2025, essas medidas provocaram instabilidade nos mercados, intensificaram temores de recessão mundial e impactaram negativamente os preços de diversos ativos.
Nas duas primeiras semanas de abril, as preocupações com uma desaceleração econômica global ganharam força, especialmente para o setor agroexportador. Commodities como café, suco de laranja e algodão são as mais suscetíveis à retração da demanda em cenários de crise. Embora os EUA tenham anunciado um adiamento das tarifas por 90 dias, o risco de impacto sobre o comércio internacional permanece.
Apesar do ambiente volátil, um cenário intermediário — com tarifas moderadas e sem recessão — abre possibilidades para o Brasil ampliar sua presença em mercados internacionais. Produtos agrícolas brasileiros podem ganhar competitividade frente aos concorrentes norte-americanos, especialmente em países como México, Canadá, China, Coreia do Sul e na União Europeia.
O Brasil já exporta uma gama relevante de produtos para os EUA, com destaque para café verde, celulose, suco de laranja e carne bovina. O país também é fornecedor importante de madeira, carne bovina industrializada e sebo.
Café
Com os EUA sendo o maior consumidor mundial da bebida, o café brasileiro mantém competitividade, especialmente frente aos concorrentes asiáticos que foram mais penalizados pelas novas tarifas. Enquanto países como Vietnã, Indonésia e Índia enfrentam taxas de até 46%, o Brasil, Colômbia e Honduras foram taxados em 10%.
Em 2024, os EUA importaram 24,6 milhões de sacas de café verde, sendo 31% de origem brasileira. A substituição do arábica brasileiro seria difícil devido ao seu volume e qualidade. Mesmo com a expectativa de uma safra brasileira um pouco menor em 2025/26, o país deve seguir como principal fornecedor, em especial pela vantagem tarifária frente ao robusta asiático.
Suco de laranja
A aplicação de uma tarifa de 10%, somada à taxa atual de US$ 415 por tonelada, tende a tornar o suco brasileiro menos competitivo nos EUA, que hoje respondem por 35% das exportações brasileiras do produto. A elevação de preços ao consumidor pode acelerar a tendência de queda no consumo global.
Nesse cenário, o Brasil pode redirecionar parte de sua produção para a União Europeia (que já absorve 51% dos embarques, somando Bélgica e Holanda) e mercados menores, como China e Japão. Apesar da vantagem mexicana — que pode manter isenção tarifária —, é improvável que o país consiga substituir integralmente o volume brasileiro, que representou 70% das importações americanas em 2024.
Proteínas animais
O Brasil vê oportunidade de ampliar sua fatia de mercado em países que tradicionalmente importam grandes volumes de carne dos EUA. Em carne bovina, o Brasil ainda é praticamente ausente no Japão e Coreia do Sul. Em carne suína, possui participação modesta no México, Canadá e Colômbia. Em carne de frango, mercados como Vietnã, Cuba, Guatemala e Taiwan ainda oferecem espaço para expansão.
A estimativa do USDA é de que a produção de carne bovina dos EUA sofra retração de 1,1% em 2025, o que pode forçar o país a manter importações para evitar pressão sobre os preços domésticos. Com concorrentes como Austrália e Argentina também sendo taxados em 10%, o Brasil segue competitivo na carne bovina.
Soja
A soja brasileira já vem se beneficiando de prêmios de exportação mais elevados. Com o aumento das tensões entre EUA e China, e a imposição de tarifas de até 145% sobre o grão americano, o Brasil tende a reforçar ainda mais sua posição no mercado chinês.
Mesmo com a postergação de tarifas generalizadas por 90 dias, o endurecimento das relações entre as duas potências cria um ambiente favorável à soja brasileira, especialmente na entressafra norte-americana, quando o Brasil assume protagonismo nos embarques.
Algodão
Seguindo lógica semelhante à da soja, o algodão brasileiro pode ganhar espaço na China. Embora a demanda chinesa deva ser menor em 2025, por conta da safra doméstica elevada e estoques maiores, os EUA ainda são um dos principais fornecedores — com 760 mil toneladas embarcadas à China no último ano.
O Brasil, que caminha para mais uma safra recorde graças ao aumento da área plantada, surge como principal alternativa ao produto americano, reforçando sua presença no mercado chinês.
Apesar do ambiente aparentemente favorável ao Brasil, uma possível reaproximação entre EUA e China pode neutralizar esses ganhos. Um eventual acordo comercial — como o firmado na chamada “fase um” em 2020 — poderia derrubar tarifas e elevar novamente as compras chinesas de produtos americanos, especialmente soja, em função do calendário de safra distinto entre os dois países.
No entanto, a imprevisibilidade dos desdobramentos atuais e a velocidade com que as tarifas estão sendo implementadas dificultam qualquer projeção concreta. No passado, a China não cumpriu integralmente os compromissos assumidos com os EUA, o que reforça a necessidade de cautela.
Para o agronegócio brasileiro, os desdobramentos do “tarifaço” americano, até meados de abril de 2025, são majoritariamente positivos. O país pode ampliar sua participação no comércio global, sobretudo em commodities agropecuárias. Contudo, esse cenário otimista depende da não intensificação das tensões geopolíticas e da manutenção das tarifas que favorecem os produtos brasileiros.
Os termos de um eventual acordo entre EUA e China, bem como a evolução das relações comerciais entre esses países e a União Europeia, serão decisivos para o futuro das exportações do agronegócio nacional. A atenção do setor segue voltada para os próximos passos na arena internacional.
Fonte: Portal do Agronegócio
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