Biológicos e Bioinsumos

Os desafios enfrentados no processo de regulamentação da Lei dos Bioinsumos (Lei nº 15.070/2024)

Reginaldo Minaré, que representa a Associação Brasileira de Bioinsumos (ABBINS) no Grupo de Trabalho (GT) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), relata, em uma entrevista exclusiva, os desafios enfrentados no processo de regulamentação da Lei dos Bioinsumos (Lei nº 15.070/2024). Confira:


Publicado em: 25/11/2025 às 10:17hs

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Reginaldo Minaré: diretor-executivo da ABBINS
Por: Gisele Gomes

Entrevista com Reginaldo Minaré, diretor-executivo da ABBINS

P: A construção do decreto que regulamentará a Lei de Bioinsumos, Lei nº 15.070 de 2024, enfrenta dificuldades?

RM: Sim. A mesma dificuldade que a lei enfrentou quando tramitou no Congresso Nacional. Dificuldade que, inclusive, tornou necessária a publicação do Decreto nº 10.375, de 2020, que propõe a criação do Programa Nacional de Bioinsumos e a apresentação dos dois projetos de lei que deram origem à Lei dos Bioinsumos: disputa comercial.

P: E que disputa comercial é essa?

RM: O mercado de insumos agrícolas no Brasil é absurdamente concentrado. Quebrar essa concentração não é bom para os maiores acionistas das grandes corporações multinacionais.

Em grande medida, os bioinsumos substituirão os agrotóxicos e os fertilizantes químicos em um futuro próximo. Produtos que a indústria tem o monopólio da produção, especialmente os agrotóxicos.

Os agrotóxicos, além de garantir o monopólio de produção para a indústria, pois são inviáveis economicamente para a produção pelo agricultor para uso próprio, são produtos que podem ser protegidos por patentes, o que confere monopólio de até 20 anos para a indústria que os desenvolveu. Isso permite uma garantia de taxa de retorno mais elevada e estável aos grandes acionistas das grandes indústrias químicas do agronegócio.

A entrada dos bioinsumos na matriz produtiva da agricultura brasileira e a garantia da liberdade dos agricultores para a produção de bioinsumos para uso próprio em suas fazendas, demoliu essa lógica do mercado de agrotóxicos.

Ao permitir a diversificação e a ampliação da concorrência, a Lei de Bioinsumos assustou aqueles que se acostumaram com o conforto do elevado lucro do mercado concentrado. Querem criar dificuldades por meio do decreto.

Os bioinsumos, além de não garantir o monopólio de produção para a grande indústria, trata-se de uma tecnologia que está livre das barreiras restritivas das patentes. Um microrganismo natural não pode ser objeto de patente no Brasil, pois é um achado e não uma invenção. Um dos requisitos para uma patente é a inventividade.

P: Mas isso não significa mais liberdade e mais concorrência? Isso não é bom?

RM: Depende. Bom para quem? Ruim para quem? Essa liberdade e maior concorrência é excelente para os agricultores brasileiros, para as pequenas e médias indústrias brasileiras e para a sociedade brasileira, pois permite que o dinheiro circule mais no mercado nacional.

Da forma como a Lei de Bioinsumos estruturou o mercado de bioinsumos no Brasil, permitindo a produção de bioinsumos prontos para uso pelas indústrias, permitindo a produção de inóculos de bioinsumos pelas indústrias e garantindo aos agricultores a possibilidade de produção de bioinsumos na propriedade, o ambiente de negócios ficou bem melhor, mais diversificado. Os grandes acionistas das grandes corporações transnacionais não perderão dinheiro, mas verão uma situação que pode ser desinteressante para eles.

Entretanto, isso permite o florescimento de empresas regionais de bioinsumos e a ampliação da margem de lucro dos agricultores, o que pode ser interessante para a sociedade brasileira.

P: Mas se a Lei é boa para a agricultura, para os agricultores e para a sociedade brasileira, não deveria ter dificuldade para sua regulamentação.

RM: Na teoria sim. Na prática é diferente. As grandes corporações desejam a possibilidade de impor a lógica do mercado de agrotóxicos aos bioinsumos. Querem também patentear os microrganismos naturais, o que seria um absurdo. Mas se contentariam com uma lei que desse proteção semelhante à lei de patentes, o que seria uma forma de burlar a exigência de inventividade, que é um requisito para as patentes.

É um absurdo, mas até a Embrapa, que é uma empresa pública, 100% dependente do orçamento público, está querendo dificultar a vida das empresas nacionais e a produção de bioinsumos para uso próprio, praticamente defendendo a agenda das grandes multinacionais. Alguém viu a presidência da Embrapa defender de forma objetiva o direito de o agricultor produzir bioinsumos para uso próprio? E olhe, que desde 2009, os agricultores brasileiros produzem legalmente, com eficiência e segurança, os bioinsumos para uso próprio. Como a Embrapa até hoje não tem uma posição clara a respeito?

Por outro lado, estamos aguardando do primeiro escalão das instituições representativas da agricultura um pronunciamento firme defendendo o direito de o agricultor produzir seus bioinsumos, sem isso o agricultor poderá perder uma excelente oportunidade de ter menos concentração no mercado de insumos agrícolas e utilizar a produção de bioinsumos para uso próprio como ferramenta de redução de custos e como instrumento de moderação de preços dos bioinsumos.

P: Como a produção de bioinsumos para uso próprio funciona como ferramenta de moderação de preço?

RM: A produção de bioinsumos para uso próprio não beneficia apenas aqueles agricultores que produzem seus próprios bioinsumos. Beneficia todos os agricultores, pois impede que a indústria pratique preços elevados. Caso a indústria aumente muito o preço do bioinsumo, o agricultor pode deixar de comprar e produzi-lo em sua propriedade ou mesmo criar uma produção em sua cooperativa. Isso faz com que a lógica de preços do mercado dos agrotóxicos não funcione para os bioinsumos. É uma chance de mudar, que poderá ser perdida.

Fonte: Gisele Gomes Comunicação

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