Fruticultura e Horticultura

Cadeia do cacau no sul da Bahia busca valorização do produto nacional

Entidades, produtores e sociedade civil pedem medidas do governo para restabelecer a autossuficiência do País na produção e reduzir as importações


Publicado em: 04/03/2013 às 16:10hs

Cadeia do cacau no sul da Bahia busca valorização do produto nacional

Um movimento que deve reunir representantes de vários setores da comunidade do sul da Bahia realizará nesta terça-feira (5 de março), em Ilhéus, a partir das 9 horas, uma manifestação em frente à entrada do Porto do Malhado.

A iniciativa – que conta com a participação de mais de 30 entidades, entre elas, associações do cacau, membros da sociedade civil, prefeituras e produtores, entre outras – pretende chamar atenção de autoridades e do governo para uma situação delicada que vem ocorrendo no mercado cacaueiro brasileiro: a alta importação do produto de outros países por parte da indústria em detrimento do produto nacional.

“Tal conjuntura afeta fortemente a região, não apenas do ponto de vista socieconômico como também ambiental”, enfatiza Águido Muniz, presidente do Instituto Pensar Cacau (IPC), organização participante do movimento. “Queremos que o governo atente para a necessidade de criar condições que equilibrem a relação entre a produção e a indústria, com especial atenção para as questões que tratem, inclusive, do risco ambiental que a região e o País estão correndo”.

Cenário

O Brasil tem hoje uma capacidade instalada de moagem do cacau em torno de 220 mil

toneladas por ano, e está a 10 mil toneladas de chegar a esse volume, o que deve ocorrer ainda este ano. A cacauicultura, que sofreu a ação devastadora da vassoura de bruxa há cerca de 20 anos, se reestruturou e vem aumentando o volume de produção ao longo do tempo. Atualmente, o Brasil é responsável pela produção de cacau de alta qualidade, premiado internacionalmente.

Evidentemente, durante o período de devastação das lavouras, a importação de amêndoas do cacau se fez necessária para atender a demanda nacional das indústrias, tendo sido a Costa do Marfim o principal fornecedor. Hoje, já não se justifica, segundo Muniz. Principalmente porque o preço de custo da arroba de cacau que vem de fora, em especial de Gana, maior fornecedor do Brasil, é maior que o nacional, em uma relação de R$ 82,00 para R$ 58,00.

“Não conseguimos entender a posição da indústria brasileira, uma vez que o cacau produzido aqui não apenas é de melhor qualidade como também mais barato”, avalia o presidente do IPC. Só no ano passado, segundo Muniz, foram importadas 68 mil toneladas, quando a necessidade era de apenas 38 mil para complementar a oferta interna. “É preciso haver um equilíbrio nessa equação, avaliar a necessidade real de importação, revisar os custos de produção e promover o desenvolvimento de regras de fiscalização e o estabelecimento de impostos que busquem fortalecer nosso cultivo e, consequentemente, os produtores e suas famílias”.

Outro representante do movimento, Durval Libânio, presidente do Instituto Cabruca, avalia que alguns fatores, a exemplo da previsão da safra, a ser realizada pela Conab, do seguro agrícola e do crédito para os produtores são de extrema importância para equilibrar a oferta e a procura no Brasil. “A cadeia já solicitou ao Ministério da Agricultura tais providências, especialmente a previsão de safra, fundamental para que a indústria possa ter dados estatísticos concretos e oficiais para seu provisionamento, mas as ações ainda não foram tomadas”.

A cadeia produtiva do cacau tem importância econômica crucial para a região do sul da Bahia, que reúne três milhões de pessoas, em 93 municípios. Direta ou indiretamente, a maior parte da população depende economicamente da produção do cacau, o que impacta diretamente em fatores como emprego, educação, saúde, qualidade de vida e inclusão social das comunidades locais.

Para Libânio, a competição dos produtores nacionais com os africanos é desigual. “Há diferenças fundamentais entre os dois países, que passam pelo custo de produção, pelas legislações trabalhista e ambiental. “Na Àfrica, tais leis inexistem, e o custo do trabalhador no campo é muito mais baixo na comparação”.

O Brasil é o único país que reúne toda a cadeia, da produção de cacau ao consumo de chocolate, e vive um momento particularmente importante. “É preciso valorizar o avanço que obtivemos nos últimos anos, pós-vassoura de bruxa, no que diz respeito ao valor agregado ao produto e definitivamente alcançamos a qualidade desejada, tendo recebido o merecido reconhecimento internacional”, enfatiza o presidente do Instituto Cabruca.

Segurança ambiental

Outro aspecto de extrema relevância – e, neste caso, não apenas para a cultura cacaueira –, diz respeito às questões fitossanitárias. Não há esse tipo de controle nas cargas que chegam aqui, nem no país de origem, nem no porto, ao desembarcar. As medidas fitossanitárias só são tomadas quando a carga chega ao importador. Assim, qualquer praga que venha no carregamento pode se espalhar pelo caminho, o que representa um risco para a agricultura de maneira geral. “Para se ter uma ideia, em uma carga vinda da Indonésia, no ano passado, foram encontrados insetos vivos”, alerta Águido Muniz.

Em 2012, o Brasil suspendeu a importação da Costa do Marfim porque o país africano não está disposto a arcar com os custos para o controle adequado. Na opinião do presidente do IPC, o mesmo rigor deve ser exigido de outros países como forma de proteger a agricultura nacional.

Cacau cabruca

Do ponto de vista ambiental, a produção do cacau representa ainda um elemento fundamental para preservação dos biomas da Mata Atlântica e da Amazônia. Por meio do sistema agroflorestal conhecido como cabruca, que significa “fazer buracos na mata para plantar”, o cacau é plantado de maneira conservacionista, sob a sombra de árvores nativas, ajudando assim a preservar mais de 228 espécies nativas, entre elas, o pau-brasil, o jequitibá, o jacarandá e o cedro.

De acordo com o Instituto Cabruca, criado para valorizar e promover o sistema, a preservação da biodiversidade propicia inclusive que animais ameaçados de extinção, como o mico-leão-da-cara-dourada, usufruam desse cenário conservado para seu deslocamento.

“A desvalorização da produção nacional do cacau implica riscos sérios, uma vez que, caso o produtor tenha que desistir do cultivo em razão da baixa renda obtida, não apenas o sistema cabruca pode deixar de ser praticado como pode promover a transformação dessas áreas em pastagens, o que seria terrível para a biodiversidade”, alerta Durval Libânio.

Fonte: Imprensa Antonio Celso Villari

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