Arroz

Produtor paulista investe em cultivo de arroz preto e vermelho

Safra do grão é colhida no Vale do Paraíba e atende alta gastronomia


Publicado em: 29/01/2018 às 16:20hs

Produtor paulista investe em cultivo de arroz preto e vermelho

O engenheiro agrônomo Omar Vieira Villela, de 64 anos, nunca entendeu muito bem por que o brasileiro só come arroz branco agulhinha. Nascido em Aparecida do Norte, cidade paulista em pleno Vale do Paraíba, ele cresceu em uma região tradicional no cultivo de arroz, onde sobravam variedades. “O plantio começou em 1905, mas ganhou impulso a partir de 1927 pelas mãos dos monges trapistas franceses que se instalaram aqui”, conta.

O Vale do Paraíba sempre foi pródigo em produzir grãos extremamente aromáticos, e o arroz vermelho sobressaiu como o tipo mais ligado àquele pedaço de terra. O relevo e o clima do vale são especialmente favoráveis à cultura, já que o caudaloso Rio Paraíba facilita a manutenção dos campos alagados. O Sítio Brejão, que pertence à sua família há três gerações, fica a apenas 200 metros da margem.

Para Omar, a especialização em arroz acabou sendo uma consequência natural. Como pesquisador da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, ele começou, ainda na década de 1990, a conduzir um cuidadoso trabalho de seleção das variedades de arroz do Vale do Paraíba. Mas as novas linhagens ficaram na gaveta por cerca de uma década. Na época, ninguém falava de arroz especial no Brasil.

“Nos anos 1970, o governo até tentou introduzir uma variedade branca mais aromática, mas a rejeição foi grande. As donas de casa reclamavam do excesso de aroma, e a ideia acabou abandonada”, afirma. A proximidade da aposentadoria, no entanto, fez o pesquisador pensar no assunto novamente. “Como tenho um olho clínico danado e consigo reconhecer tipos diferentes no meio dos demais, comecei a selecionar alguns deles para plantar. Mas era um hobby, nem pensava em lançá-los no mercado.”

Omar pode não ter planejado, mas acertou em cheio. A pesquisa deu tão certo que, em 2010, ele associou-se ao filho, o psicólogo Felipe Stiebler Villela, de 32 anos, e fundou a Alto do Marins. O nome faz referência ao Pico do Marins, um dos mais altos da Serra da Mantiqueira, visível de toda a propriedade, localizada em Canas (SP). O arroz preto, obtido a partir daquela população original que pertencia ao banco de germoplasmas da Embrapa, foi o primeiro a ser lançado – a adaptação levou exatos oito anos.

Entre 2010 e 2013, a Alto do Marins vendeu o arroz preto exclusivamente a granel. As vendas se concentravam na zona cerealista de São Paulo e ficavam a cargo do terceiro sócio, Francisco Cândido dos Reis Neto, de 36 anos, que já tinha experiência no setor de vinhos e assumiu a distribuição. “Eu colocava as sacas na caminhonete toda semana. Levava 600 quilos de uma vez e vendia tudo”, lembra.

O trio logo entendeu que seria preciso aumentar o portfólio e agregar valor aos produtos para a empresa crescer. Foram lançados o arroz miniarbóreo, o jasmine integral e o arbóreo integral. Todos passaram a ser embalados em sacos de 1 quilo fechados a vácuo, dentro de caixas de papelão com a foto da lavoura.

Alta gastronomia

Com os cereais em mãos, Francisco passou a focar em um novo nicho de mercado: empórios de luxo e restaurantes de alta gastronomia. Os grãos Alto do Marins, incluindo o recém-lançado basmati vermelho, chegaram aos cardápios do Esther Rooftop, que pertence ao francês Olivier Anquier, e do restaurante Skye, no topo do Hotel Unique, ambos em São Paulo. No Rio, foi incorporado pelo Bazzar, em Ipanema. Na Casa Santa Luzia, também na capital paulista, o quilo do arroz pode chegar a R$ 20, dependendo da variedade. Segundo Omar Villela, a rentabilidade na produção de arrozes especiais é 30% maior.

Hoje, as cinco variedades de arroz Alto do Marins são cultivadas em uma área de 15 hectares (80% são reservados ao arroz preto, best-seller da linha). Para baratear o custo de manutenção dos campos alagados, que têm 7 centímetros de profundidade, Omar optou por deslocar a janela de plantio. “Teoricamente, ela começa em agosto, mas nessa época ainda chove pouco. Por isso, espero começar o período das chuvas, em setembro”, explica. O ciclo dura de 115 a 125 dias, fazendo com que a colheita ocorra entre dezembro e janeiro.

Por ano, a safra rende 200 toneladas. A demanda, porém, já é maior. “Cinco pequenos produtores da região se tornaram nossos parceiros. Alguns têm apenas 2 hectares plantados. Não foi difícil convencê-los, pois a massificação da cultura do arroz branco comum jogou o preço lá embaixo e fez o Vale do Paraíba perder seu potencial. Muitos estavam falidos”, diz Francisco Neto. Os grãos são beneficiados e embalados em estrutura própria da Alto do Marins, um galpão de 350 metros quadrados nas cercanias do sítio. “Como as máquinas são feitas para o arroz branco, tivemos de adaptá-las a cada um de nossos grãos”, conta Omar.

Embora a produção de arrozes especiais vá de vento em popa, a menina dos olhos do pesquisador é um pequeno campo alagado bem ao lado da lavoura. A área funciona como um laboratório a céu aberto, onde ele desenvolve novas variedades e aprimora as já existentes.

Como um pai zeloso, Omar tem planos traçados para várias delas. O arroz preto, por exemplo, está sendo selecionado para que, em breve, tenha grãos cada vez mais negros, sem qualquer manchinha clara. Entre as novas variedades em teste, algumas são especialmente promissoras. É o caso do arroz preto selvagem, que tem lançamento previsto para fevereiro de 2018. “São grãos longos, bonitos e muito aromáticos”, ele diz. Medo de revelar os segredos à concorrência? Omar jura que não tem. “As outras empresas vão levar uns dez anos para chegarem ao ponto de desenvolvimento em que estamos.”

Fonte: Globo Rural

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